Enlouquecido
O dia em que ele enlouqueceu começou como qualquer outro. O calor já era de rachar bem cedo de manhã, e logo começaram a chegar as clientes ao negócio. Ele ia de um lado ao outro, solicitado por uma e por outra. Apesar do local ser arejado, ele ficava sob o ar quente o tempo todo, e mesmo mudando de posição e indo de cá pra lá, não conseguia escapar do bafo ardente que o fazia sentir queimando por dentro.
Já fazia um bom tempo que ele não aguentava mais a situação. Não via a hora de se livrar desse emprego dos infernos, mas nunca encontrava uma alternativa, e tinha que se submeter à mesma rotina, o mesmo calor.
Esse dia ele não conseguiu mais suportar. Depois de uma manhã intensa de duro trabalho, ele chegou ao limite.
"Não suporto mais isso!" pensou com seus botões, "esse trabalho me deixa maluco!"
Estava pensando o que faria a continuação quando de novo foi solicitado para o serviço. Apenas sentiu o calor que chegava quase a sufocá-lo, ele reagiu. Agarrou-se com todas as forças às fibras que o envolviam, mordeu, rasgou, puxou.
Se ouviram gritos desesperados, uma mulher começou a soluçar. Sentiu mãos que tentavam segurá-lo e afastá-lo da sua pobre vítima, mas ele puxou e se enrolou ainda mais, preferindo perder os dentes antes que largar a presa. Só quando sentiu um líquido quente a inundá-lo e o gosto metálico do sangue meio que tornou em si. Lentamente parou de morder, e se deixou escorregar até o chão, cansado demais para pensar nas consequencias dos seus atos.
Essa noite, todos os jornais emitiram a chocante notícia do badalado salão de uma cidade do interior, onde uma escova de cabelo tinha cobrado vida e arrancado o cabelo de uma das clientes mais prestigiosas da cidade.