A NOIVA NA VITRINA
A NOIVA NA VITRINA
A noiva imóvel trancada na vitrina invade o vidro. E sobre braços tristes de manequim brilha rendas de lantejolas. Botões de cetim. Desfila no pedestal de mármore seu riso parado de porcelana.
Acordada de seu sono de estátua anônima. Envolta em trajes nupciais. E véus invasores. Desabotoa pernas e passos. E sai.
Sem rumo. Sem alento. Se desarruma no vento. Se solta nas pedras da rua. E solta o corpo pálido. De sangue parado. E escolhe soltar os cabelos. Deitar nas calçadas as amarras dos véus.
A vida a chama. A paixão a chama. Acende a chama.
O sol esquenta seu corpo. Tudo escuta. Tudo sente.
No peito o pulsar do sangue. Quente.
No horizonte o cheiro do mar azul. Frio.
O som das ondas dos mistérios. Nas quebradas dos desafios. Mornas.
Caminha pelas areias. Brancas e grossas. Toca a água fresca de espuma. Completa-se no mar de belezas infinitas.
Sobre as ondas o sol arrasta raios. São cores que mergulham dentro. E fora.
Veste-se da nova roupa. Do novo riso. Dos sentimentos que escondeu. Daquilo que agora sente.
Passa um pássaro. No céu um risco. De liberdade recém-chegada. Chamam-na rumores. Além de todos os tempos. De todos os amores. Para além de toda modelagem. Para a intimidade de toda entrega.
Mírian Cerqueira Leite