ENSAIO SOBRE O 'ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"
Observação Inicial do autor: ( Para quem não leu ou não sabe do que trata o romance "Ensaio Sobre a Cegueira" de José Saramago, este conto não fará o menor sentido. Para os restantes é possível que faça.)
Com avidez e ininterruptamente prossegui minha leitura do "Ensaio Sobre a Cegueira" de José Saramago, literalmente preso desde a primeira página quando, já na altura da segunda metade da obra, completamente envolvido pela trama percebi as letras se projetarem do papel, embaçadas, sob o efeito de uma luminosidade estranha, excessiva e repentina que parecia brotar do âmago das folhas. Interrompi por alguns minutos, para que meus olhos aliviassem. Logo depois, ansioso pelo desfecho da trama, tornei às páginas. Mais um tempo e as letras voltaram a embaçar. Depois foram diminuindo, até eu não mais percebê-las. Fechei os olhos por alguns instantes, pressionando fortemente as pálpebras. Depois, lentamente, reabri e havia apenas o breu absoluto. Por algum motivo incompreensível e inusitado eu estava completamente cego. Horrorizado tateei pela sala onde estava, esbarrando em móveis e utensílios pelo caminho, até chegar à estante localizada em um corredor estreito, onde guardava meus livros. Rememorei, mentalmente, a ordem que as obras ocupavam em suas prateleiras e não tive muita dificuldade de encontrar o que veio a ser minha salvação para aquele momento: uma edição do “Ensaio Sobre a Cegueira” , de José Saramago, em Braille.
Assim pude ler o romance até seu desfecho, naquele mesmo dia.