Silêncio

E mais uma vez ele gritou. Gritou forte, sentindo o ar abandonar seus pulmões até o tórax começar a doer, como se pressionado por alguma força invisível. Viu então seu desesperado apelo por atenção findar-se em um odiado eco, que fazia questão de lembrar-lhe da inutilidade de seu esforço. Jamais odiara tanto o som da própria voz repetindo-se em sua mente.

Uma inquietude brotava-lhe do peito, fazendo crescer a angústia que remoia suas entranhas. A agonia de não poder ser ouvido. Apesar de todas as tentativas, não conseguia se fazer notar um instante sequer. A frustração de estar tão próximo e ao mesmo tempo tão distante tomava conta dele, reduzindo-o a nada além de um ser incomunicável. Era como se uma barreira imperceptível impedisse qualquer comunicação.

Havia tanto a ser dito, tantos assuntos engasgados. Alguns importantes, outros nem tanto. Sentimentos, opiniões, elogios, felicidades, tristezas; tudo aquilo que sempre quis exteriorizar, mas que, contra sua vontade, reprimia. E apesar de tudo, naquele exato momento, não queria nada disso. Tudo o que ele queria era ser notado. Mas, novamente, suas esperanças iam abaixo com o irritante eco que trazia de volta seu clamor como um tapa em seu rosto. Ele era, irrefutavelmente, invisível.

Com os olhos vermelhos, a cabeça explodindo e a garganta latejando, rendeu-se ao cansaço, deixando-se cair abatidamente ao lado dele. Ainda podia sentir o peso dos gritos sufocados pela imensidão surda que se estendia a sua volta, apesar de estar a apenas três passos de distância de seu interlocutor.

Um misto de vergonha e medo inundou seus pensamentos, fazendo-o se encolher como um feto, apesar de o motivo para tal confundir-se com o intenso frio que sentia. Tinha medo de nunca mais poder se expressar, de vagar por aí despercebido, de ser um fantasma. Tudo isso somado à grande vergonha de ver-se naquela situação. Seu corpo tremia e a angústia, que crescia cada vez mais em seu peito, agora se estendia, subindo-lhe o pescoço e transbordando na única manifestação aparente de seus reais sentimentos: uma lágrima.

O que começou com apenas um pequeno ensaio de sentimentalismo, agora se transformava em um grande e emocionado choro. Com as lágrimas escorrendo por seu rosto, uma a uma, elas traduziam cada dor, cada grito, cada desabafo que, em vão, tentara ser expresso em palavras. Com o ininterrupto seguir de seu pranto, sentia-se, enfim, livre da grande massa de palavras presa dentro de si, aquela que outrora crescia como um câncer. Sentia-se então leve. Sentia-se.

Recobrando as forças, levantou-se. Olhou em volta e notou, curioso, que tudo permanecia igual, como se o mundo simplesmente ignorasse seu desabafo. Voltou-se então para a pessoa a quem, inutilmente tentara dirigir a palavra algum tempo antes e, pela última vez, tentou um tímido e engasgado “oi”.

Para sua surpresa, um pequeno sorriso figurou no rosto do outro juntamente com um discreto aceno de mãos em resposta fática à saudação prévia. Emocionado, tentou buscar em sua memória tudo aquilo que gostaria de ter dito. E então, surpreendendo-se mais uma vez, compreendeu subitamente: Não havia mais nada a ser dito.

L G Teixeira
Enviado por L G Teixeira em 22/01/2017
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