IRONIAS DA CADEIA ALIMENTAR
Observava atentamente os movimentos da lagartixa na parede. Sorrateira ela se esgueirou em meio aos quadros, passou pelo relógio, chegou ao interruptor. Lentamente. Silenciosamente. Passo a passo atravessou o cômodo em direção à pequena e desatenta mariposa ali pousada. Parecia um leopardo segundos antes de um ataque à gazela. Não havia como assistir à cena e não imaginar seus ‘ancestrais’ dinossauros numa caçada alucinante em meio às densas florestas jurássicas.
Mais alguns passos e ela já estava muito próxima ao alvo. Encolheu o corpo. Preparou o ataque. Projetou-se contra a presa. E... Zás! Uma vassourada fulminante acertou em cheio as duas personagens. A mariposa já caiu no chão inerte. A lagartixa, gravemente ferida, ainda tentou se arrastar pelos cantos. Foi inútil. Mais um golpe certeiro e o sopro de vida restante esvaiu-se em segundos. Somente parte da cauda ficou pulando no chão por alguns segundos. Finalmente. Era a última. Tinha de ser a última. Odiava lagartixas. Promovera nos últimos dias uma verdadeira cruzada contra aqueles bichos asquerosos. Só restava aquela. Agora, não mais. Limpou a sujeira. Missão cumprida.
Dias depois acordou com uma insuportável dor de cabeça e atrás dos olhos. O corpo também doía muito. Mal conseguia se me mexer. Percebeu também que estava com febre. Tomou uma aspirina. Ligou para o SAMU. Foi socorrido, mas não resistiu. Entrou para os registros de óbitos por Dengue Hemorrágica daquele ano.