A tentação de Padre Maurílio
Mocetão puro e pio, cara cheia, calvejância precoce, porejante suor, eis um singelo bosquejo de Padre Maurílio. De um desempenho brilhante nos estudos clericais, fora cair na modorra de sua cidadezinha natal, a Velha Serrana, para exercer o sacerdócio, como co-adjutor dum aguerrido e muito reverenciado vigário Pontello.
O tempo da batina e das missas em latim já ia cedendo espaço ao aggiornamento proclamado pelo Papa João, mas não sem certa relutância do beatério, e do próprio clero, sem que houvesse uma manifestação mais clara de Maurílio, senão o seu horror ao clergy-man.
Maurílio, que já havia transposto o ardor da juventude e que, pacientemente empregava suas horas vagas no magistério, batalhava, contudo, uma tentação que o mortificava. E, sempre temeroso dum flagra, em público, costumava baixar o rosto para que a turba não imaginasse o resto. Mas não havia feito desse jeito. O que corria à boca pequena, espalhava-se como fogo no cerrado.
E, na inquietação infantil, dava-nos graça botar sentido naquele mais solene momento da eucaristia, quando Maurílio, junto ao altar, elevava o cálice para a consagração: dois dedos sequiosos roçavam-lhe as narinas à busca da seiva vital, o sacro sal, que em plena liturgia, oralmente dele se nutria. Per ipsum, cum ipso et in ipso.