A MENINA QUE FAZIA CHOVER

Dizem que nasceu em dia de tempestade. Não se sabe ao certo se a chuva veio por causa dela ou se ela veio por causa da chuva, sabe-se apenas que trazia a chuva no olhar. Desde pequena, tornou-se notória entre os mais chegados: todas as vezes que colocava os pés para fora de casa, um aguaceiro desabava sobre a cidade.

No princípio era divertido, sentia-se especial, diferente das outras meninas. Com o passar do tempo, percebeu que as pessoas a olhavam de uma forma estranha e se afastavam apressadas tão logo ela se aproximava. Muito cedo, não lhe restaram mais amigos. Era o início da sua solidão.

Vez por outra, sua mãe a levava para dar um passeio na praia, sempre com um guarda-chuva à mão. Ela andava pelo calçadão deserto, e tentava imaginar como seria num domingo de verão, com as pessoas se divertindo, felizes... Ficava a contemplar o mar, em meio ao aguaceiro e sentia-se deprimida por saber que nunca seria igual às outras pessoas. Ela nunca viveria a felicidade solar de um dia de verão.

Foi crescendo, cada vez mais pálida, vendo o sol pela janela do seu quarto, mas sem nunca poder senti-lo na pele. Em sua cabeça, fantasiava um romance entre o sol e a lua, onde um jamais se encontraria com o outro, a não ser por alguns momentos, ao amanhecer ou ao entardecer do dia.

Tentou descobrir o que acontecia com ela. Pesquisou na internet, nos livros e onde mais pudesse ser encontrada uma resposta para essa anomalia inexplicável, tudo em vão. Não conseguiu a menor pista que ajudasse a desvendar o mistério que era sua vida. Ela era única e nada poderia modificar isso.

Um dia, cansada de ficar em casa, resolveu sair. Sua amiga inseparável, a chuva, a recebeu logo que chegou ao portão. Não levou guarda-chuva, tampouco avisou sua mãe. Simplesmente foi andando a esmo, pelas ruas vazias da cidade, e quando deu por si estava sentada num banco, em frente ao mar. Não havia ninguém à vista, a chuva agora caía aos borbotões, e ela, apesar de totalmente encharcada, sentia seu corpo quente como nunca antes sentira. Tirou os sapatos e caminhou devagarzinho pela areia molhada. Chegou à beira do mar, a água estava morna, a chuva agora lhe parecia reconfortante. Entrou um pouco mais na água, achando maravilhosa aquela sensação de ser abraçada pelo imenso oceano e nem percebeu que a correnteza, furiosa, a puxava cada vez mais para longe da areia.

Foi encontrada três dias depois, por pescadores, boiando de olhos abertos para o céu azul. Mesmo com o corpo inchado, podia-se perceber um nítido sorriso em seu rosto pálido.

Fazia um lindo e ensolarado dia de outono.