De pijamas
De pijamas, não me pegas. E pouco importa que a vaca dentuça tussa. Mas ao longo dessas seis décadas e meia vividas, e parcialmente dormidas, tive pijamas em três vidas.
Na tenra e terna infância vimos papai chegar de Beagá com aqueles retalhos de panos riscados, coloridos e foram momentos divertidos esperá-lo medir, cortar, costurar e neles nos metermos, para sonhar. À Vicky coube o azul e branco, o verde foi pra Bebel, o meu o alaranjado e o vermelho ao Beu se deu. Só ao mais petiz Zeluiz foi que coube - e ele quiçá nem o soube - esperar a vez.
Embora pouco discretos, eram completos os pijaminhas, amigos de sono e sonhos diletos. Duraram bons anos, até os finais danos. Afinal, eram panos, humanos.
Meu segundo confronto com um pijama já se deu à beira dos quarentanos,
quando, atraído e traído pela barganha do preço, comprei-me um, made in China, num supermercado de Jacarta. E era acetinado, cor carmesim. Não chegamos a passar uma noite juntos. Lina, ao ver o disparate, teve pena de mim. E no subsequente ato, consequente, deu-lhe fim.
A terceira e derradeira vez passou-se em Berlim e já me pegou cinquentão, literalmente de calças na mão. Estava em oficial missão, alojado na residência ambassadorial e, por um extravio a mala que me acompanhava me deixara a ver navio. O anfitrião, compadecido de meu estado dalma, foi extremamente obsequioso, levando-me ao aposento, após o jantar - e antes de minhas abluções e orações, um kit de higiene e um conjunto de pijamas próprios em que bem caberia um campeão de sumô. Jamais tive sono mais folgado - ainda que não o tivesse experimentado...