Pesadelos e Alucinações
Os pesadelos começaram há mais de um ano, logo após Nina abandonar-me; desistir de salvar o nosso falido casamento. A pior sensação é a de acordar e não saber onde se está. Durante a noite ficava com as janelas abertas. A iluminação da rua entrava pela casa espantando as trevas. Quando fazia frio, deixava as luzes do apartamento acesas. Os sonhos ruins se intensificaram de tal maneira, que comecei a não dormir, por medo. O tema é sempre o mesmo: uma mulher morta e mutilada. Se vejo detalhes, ela se parece com Nina. Às vezes não a reconheço. Algumas coisas são recorrentes: ela abre os olhos sem vida e sorri com seus dentes quebrados e ensanguentados.
Comecei a perambular pela noite. Primeiro no bairro, depois no centro da cidade. Bares, cinemas e o que mais aparecesse. Faltava ao trabalho. Passei a frequentar emergências de hospitais e postos de saúde. Declarei sintomas inexistentes. Arrumei alguns atestados médicos verdadeiros e comprei outros, falsos. A farsa não foi muito longe. Fui demitido. Com o dinheiro pago pela empresa, consegui sobreviver por algum tempo.
Passei a alimentar-me muito mal e emagrecer. Durante o dia dormia algumas poucas horas, descontínuas. Mesmo assim, volta e meia o pesadelos me assaltavam. Estava precisando de ajuda profissional.
Através da internet encontrei uma psicóloga. Ao chegar ao consultório fui surpreendido pela atendente utilizando Hijab, o véu muçulmano. Para minha surpresa a psicóloga Raissa, também usava um. Tentei ignorar e respondi àquelas perguntas genéricas da primeira consulta. Falei dos pesadelos e da insônia. Fiquei de voltar na outra semana. Na saída, esbarrei num sujeito alto com cara de árabe. Pedi desculpas, as quais foram ignoradas. Voltaria encontrá-lo outras vezes.
Ao sair do consultório, anoitecia e minha agonia recomeçou. Tentei ir ao cinema, desisti. Tomei o metrô e voltei para casa. Sai novamente pelo bairro. O árabe mal encarado passou por mim. Resolvi segui-lo. No bairro há uma mesquita. Ele entrou e lá permaneceu durante uma hora. Continuei seguindo-o. Isto ocupou meu tempo. Entrei num destes clubes noturnos e uma das mulheres lembrou-me Nina. Paguei pelo programa num motel barato. Amanheceu.
A situação piorou. Meu sono se resumia a pequenos cochilos. A insônia impedia os pesadelos. Voltei ao consultório da psicóloga. Ao chegar, encontrei novamente o árabe, saindo do consultório. Fico sabendo pela recepcionista que o nome dele é Samir e trata-se do irmão de Raissa. Fui atendido e depois de pouco tempo, encaminhado a um psiquiatra. Não tenho ideia do que falei.
O psiquiatra atendia no mesmo prédio. Minha consulta foi rápida. Receitou-me um medicamento que, supostamente, resolveria minha insônia e, talvez os pesadelos. Não foi o que aconteceu. Comecei a ter alucinações.
Parei de tomar o medicamento, e as alucinações se intensificaram. Vi o Samir participando do massacre no Charlie Hebdo. Muito sangue e o árabe rindo de tudo aquilo. Corri e entrei numa igreja. Lá estava ele rezando. Rezando num templo católico? Ele não é muçulmano? Ajoelhei-me perto dele. Sorriu com os dentes quebrados e sangrando. Levantei e ao sair apressado, quase derrubei o padre corcunda, o que me lembou o Quasímodo. Tentou falar comigo, mas saí correndo. Passou um ônibus vermelho de dois andares do tipo londrino. Fiz sinal, mas não parou. Andei mais um pouco e cheguei a Times Square, onde encontrei Don Corleone, ao lado de Al Capone, ambos fumavam charutos e riam muito. Um policial perguntou se estava tudo bem. Estava de volta ao meu bairro.
Não tenho ideia de quanto tempo se passou. Continuei andando até chegar à entrada de um hotel. Encontrei um grupo animado de pessoas. Acho que era um desses encontros corporativos. Tiravam fotos. Nina fazia parte do grupo. Ao seu lado estava Samir. Riam muito, pareciam felizes. Um homem que parecia Jack Nicholson, cuidava do jardim, utilizando um cortador de grama do tipo leve, um aparador. Esperei que o casal se afastasse do grupo. Tomei o instrumento das mãos do jardineiro e parti para cima de Samir. Atingi em cheio o seu rosto. Continuei agredindo até que ele ficasse desfigurado. O cortador continuava ligado. Fui imobilizado e agredido pelos demais componentes do grupo. Nina, ou a moça que se parecia com ela, gritava muito. O rapaz morreu no hospital. Seu nome era Antônio.
Com a chegada da polícia pararam de me agredir. Fui levado a um hospital e depois para a delegacia. Tanto o delegado, quanto os policiais se pareciam com o Samir. Fiquei preso durante certo tempo. Não sei quanto demorou. Fui removido para uma cela “especial” por ter curso superior. A única pessoa que foi me visitar foi a Raissa. Após um ano fui julgado e encaminhado ao Manicômio Judiciário, um hospital-presídio. Estou sempre dopado. Parece que não tenho mais pesadelos. Ou, pelo menos, não lembro-me deles. O único problema é que acho que uma das enfermeiras é a Nina e o médico, o Samir.
Os pesadelos começaram há mais de um ano, logo após Nina abandonar-me; desistir de salvar o nosso falido casamento. A pior sensação é a de acordar e não saber onde se está. Durante a noite ficava com as janelas abertas. A iluminação da rua entrava pela casa espantando as trevas. Quando fazia frio, deixava as luzes do apartamento acesas. Os sonhos ruins se intensificaram de tal maneira, que comecei a não dormir, por medo. O tema é sempre o mesmo: uma mulher morta e mutilada. Se vejo detalhes, ela se parece com Nina. Às vezes não a reconheço. Algumas coisas são recorrentes: ela abre os olhos sem vida e sorri com seus dentes quebrados e ensanguentados.
Comecei a perambular pela noite. Primeiro no bairro, depois no centro da cidade. Bares, cinemas e o que mais aparecesse. Faltava ao trabalho. Passei a frequentar emergências de hospitais e postos de saúde. Declarei sintomas inexistentes. Arrumei alguns atestados médicos verdadeiros e comprei outros, falsos. A farsa não foi muito longe. Fui demitido. Com o dinheiro pago pela empresa, consegui sobreviver por algum tempo.
Passei a alimentar-me muito mal e emagrecer. Durante o dia dormia algumas poucas horas, descontínuas. Mesmo assim, volta e meia o pesadelos me assaltavam. Estava precisando de ajuda profissional.
Através da internet encontrei uma psicóloga. Ao chegar ao consultório fui surpreendido pela atendente utilizando Hijab, o véu muçulmano. Para minha surpresa a psicóloga Raissa, também usava um. Tentei ignorar e respondi àquelas perguntas genéricas da primeira consulta. Falei dos pesadelos e da insônia. Fiquei de voltar na outra semana. Na saída, esbarrei num sujeito alto com cara de árabe. Pedi desculpas, as quais foram ignoradas. Voltaria encontrá-lo outras vezes.
Ao sair do consultório, anoitecia e minha agonia recomeçou. Tentei ir ao cinema, desisti. Tomei o metrô e voltei para casa. Sai novamente pelo bairro. O árabe mal encarado passou por mim. Resolvi segui-lo. No bairro há uma mesquita. Ele entrou e lá permaneceu durante uma hora. Continuei seguindo-o. Isto ocupou meu tempo. Entrei num destes clubes noturnos e uma das mulheres lembrou-me Nina. Paguei pelo programa num motel barato. Amanheceu.
A situação piorou. Meu sono se resumia a pequenos cochilos. A insônia impedia os pesadelos. Voltei ao consultório da psicóloga. Ao chegar, encontrei novamente o árabe, saindo do consultório. Fico sabendo pela recepcionista que o nome dele é Samir e trata-se do irmão de Raissa. Fui atendido e depois de pouco tempo, encaminhado a um psiquiatra. Não tenho ideia do que falei.
O psiquiatra atendia no mesmo prédio. Minha consulta foi rápida. Receitou-me um medicamento que, supostamente, resolveria minha insônia e, talvez os pesadelos. Não foi o que aconteceu. Comecei a ter alucinações.
Parei de tomar o medicamento, e as alucinações se intensificaram. Vi o Samir participando do massacre no Charlie Hebdo. Muito sangue e o árabe rindo de tudo aquilo. Corri e entrei numa igreja. Lá estava ele rezando. Rezando num templo católico? Ele não é muçulmano? Ajoelhei-me perto dele. Sorriu com os dentes quebrados e sangrando. Levantei e ao sair apressado, quase derrubei o padre corcunda, o que me lembou o Quasímodo. Tentou falar comigo, mas saí correndo. Passou um ônibus vermelho de dois andares do tipo londrino. Fiz sinal, mas não parou. Andei mais um pouco e cheguei a Times Square, onde encontrei Don Corleone, ao lado de Al Capone, ambos fumavam charutos e riam muito. Um policial perguntou se estava tudo bem. Estava de volta ao meu bairro.
Não tenho ideia de quanto tempo se passou. Continuei andando até chegar à entrada de um hotel. Encontrei um grupo animado de pessoas. Acho que era um desses encontros corporativos. Tiravam fotos. Nina fazia parte do grupo. Ao seu lado estava Samir. Riam muito, pareciam felizes. Um homem que parecia Jack Nicholson, cuidava do jardim, utilizando um cortador de grama do tipo leve, um aparador. Esperei que o casal se afastasse do grupo. Tomei o instrumento das mãos do jardineiro e parti para cima de Samir. Atingi em cheio o seu rosto. Continuei agredindo até que ele ficasse desfigurado. O cortador continuava ligado. Fui imobilizado e agredido pelos demais componentes do grupo. Nina, ou a moça que se parecia com ela, gritava muito. O rapaz morreu no hospital. Seu nome era Antônio.
Com a chegada da polícia pararam de me agredir. Fui levado a um hospital e depois para a delegacia. Tanto o delegado, quanto os policiais se pareciam com o Samir. Fiquei preso durante certo tempo. Não sei quanto demorou. Fui removido para uma cela “especial” por ter curso superior. A única pessoa que foi me visitar foi a Raissa. Após um ano fui julgado e encaminhado ao Manicômio Judiciário, um hospital-presídio. Estou sempre dopado. Parece que não tenho mais pesadelos. Ou, pelo menos, não lembro-me deles. O único problema é que acho que uma das enfermeiras é a Nina e o médico, o Samir.