VIVENDO E MORRENDO CONSCIENTE
Atualmente a vida me sorrir diferente, pois nunca soube o que realmente é vida. Não me refiro a nada material, mas antes a algo que tenho buscado ao longo da minha existência consciente, algo que não vejo em que pese a sua concretude, algo abstrato que me toca mas, não me dá acesso, algo que busco compreender sem entender. Claramente hoje me sinto vivendo depois de um acontecimento, de um certo mecanismo que pode ter decretado o fim de minha existência terrena. Também pode ser que não, mas minha sensação é de sobrevida. Sempre perdi parte do meu tempo pensando de que maneira morreria, é bem verdade que ainda não sei, pois a pericividade da vida é tamanha que jamais saberemos quando iremos morrer,mesmo quando afetados por um mal mortal. Assim me contava Tota da sua angústia perene na ânsia de descobrir um sentido para vida.
-Tota, por que você se preocupa com isso? Ninguém escapará de um dia morrer, dizem que a morte tem até um cronograma onde constam os nomes dos próximos mortais, cujo critério de escolha primário é a idade. Não se preocupe com isso, qualquer um de nós está sujeito a proximamente está listado no cronograma dela que, aliás, é a única verdade a que nós humanos temos certeza e podemos afirmar. O resto é especulação!
-Amigo, falou Tota - Você é o meu único amigo é quem me sinto à vontade para confessar minhas angústias, te falo isto porque sempre estive às voltas com esse problema, ainda não sei de que vou morrer, mas já guardo dentro de mim uma grande possibilidade.
-Tota você está falando da sua enfermidade?
-Sim.
-Calma amigo, mais uma vez insisto para que você não se mate antes do tempo, até porque, depois que tomou este diagnóstico, que já faz seis anos, já vimos muitos conhecidos irem embora, pessoas cuja estado de higidez mostrava que no mínimo viveriam mais vinte anos. Há pouco dias, quando cheguei de viagem soube que o Duda havia batido as botas, partindo desta para uma melhor. Além do que, bicho, a nossa verdadeira vida não é sobre a terra, aqui passamos uma parte da vida, aqui é o lugar para onde viemos evoluir moralmente pagando nossos pecados pregressos!
-Disse isso e me retirei da sala em busca do banheiro quando de repente Tota me interpela:
-Lá vem você com essas coisas de espiritismo! Porra! Eu estou falando sério, estou falando daqui da terra onde as pessoas são de carne e osso e morrem!
-Calma amigo, retruquei - você não sabe da missa um terço, essa tua visão de vida é preconceituosa, foi colocada na tua cabeça de forma equivocada, como uma falsa verdade, o que faz as pessoas pensarem que a vida se encerra com a morte, que não existe nada pós morte.
Deixei Tota pensativo, sentado numa poltrona, em genuflexão quase com a cabeça entre as coxas. Ali permaneceu pelos uns bons quinze minutos sem proferir um vírgula, pensei que estivesse adormecido quando de repente me interpela - você não me leva a sério, sempre que toco nos meus problemas você diz que não existem!
-Tota, não é isso, você é meu melhor amigo, talvez o único, és mais presente na minha vida que um irmão, o que pra mim me parece que você é. O problema é que você está sempre querendo resolver problemas da vida que estão fora do controle dos humanos. Repito - tudo isso devido a arraigados preconceitos adquiridos durante a sua formação. Agora você está passando por um momento difícil, está com um câncer (imperador de todos os males) no bucho, mas, isso não é o fim. Estás em tratamento sob pleno controle, ademais sabes que não necessariamente morrerás dele. Já viste que este teu câncer é indolente e anda devagar e no teu caso está tendo uma distribuição anômala! Seria bom que te lembraste do que falou teu oncologista, se não te lembras, lembrar-te-ei. Ele disse, desde o início do tratamento que teu caso tem bom prognóstico, e pelo andar da carruagem é o que temos visto da evolução, portanto calma com o andor que o santo é de barro! Que trates de viver sem esperar a morte, pois ela é certa e virá, não sabemos quando, o que é ótimo, mas, que virá, virá! Além do que nascemos, vivemos e morremos.
Tota ouviu tudo calado, cabisbaixo, acabrunhado, sentindo dor no peito, para em seguida dá um gemido, começar a emborcar em direção ao chão, só dando-me tempo de segurá-lo pelo tronco, apoiar sua cabeça em meu colo e ver morrer nos meu braços, meu melhor amigo!
José Antonio da Silva.
-