Negócio agridoce
O tio Leopoldo, que na verdade era tio de mamãe, e tio avô nosso, chamou papai ao quintal para lhe mostrar a sua mais nova invenção: logo à saída da cozinha, montada sob uma coberta, novinha, e certa, a sua fábrica de doces. Doces de amendoim, digamos assim. Tás a fim?
Basicamente, lá estavam aquele tacho enorme, levando fogo por baixo, bem nos "conforme", e o tio sorridente, explicando toda a mecânica docente: "Aqui, Luís, essas polias, ligadas nesse motorzinho, levam o movimento para o tacho, sem ter precisar de alguém o tempo todo mexendo a massa."
E as rodas de bicicleta improvisadas, fazendo girar as ditas correias e polias, davam confiabilidade àquele mestre das invenções, adoçando-lhe a vida, mais de intenções.
Cortada a doçama de uma bandeja, porção sobeja, pudemos todos endossar - sem poder ali os dentes escovar - as proezas daquele falar.
Tio Leopoldo distribuía doces pela região divinopolitana, e nessa sua rara folga dominical, botou-nos em seu Austin, para uma volta pela cidade e lá saímos sacolejando onde o asfalto, falto, andava faltando. E tio Leopoldo explicando, gesticulando.
Deu meia volta na praça da catedral, que ainda se encontrava em construção, sem fazer a persignação, ainda que bom cristão. E sob nós, o puro, sacro chão. E cada sacolejão.
Iam bem os negócios, de uma forma geral, não se queixava o tio inventor, senão dalgum devedor, mais impertinente, como aquele que diante duma cobrança, fora à cozinha e voltou empunhando um garfo ameaçando o cobrador. E tio Leopoldo, todo sério, nada lério, dizendo: se for para me ameaçar, faça-o da forma correta, o garfo é para destrinchar um franguinho bem cozido. Será que nem de uma faquinha o senhor aí é servido?