Cara de Vicente
Eu tinha horror do Zé Vidal. E nem queria vê-lo pela frente. Daí é que, sempre que podia, dava volta - ao redor do único quarteirão do povoado - para não ter que passar sob o seu nocivo crivo e ouvi-lo, petulante, do alto de sua janela, com aquela caçoada implacável, que me fazia tremer nas bases e em todas as quatro fases:
- Esse menino tem cara de Vicente!
Eu ficava era possesso. Minha amarelidão brumadiana se avermelhava, mas de nada adiantava minha cara mais brava. Ele ainda gargalhava.
Cheguei a rogar praga, mandá-lo ao inferno, chamá-lo de barrigudo, e nada me amenizou a dor de 'ter cara de Vicente'.
Todos os Vicentes que eu conhecia eram feios ou velhos. E o que de todos, contudo, menos me doía era ainda o Vicente da Lia - um pobre coitado que vivia pelas ruas com seu ferrão, chapeu de palha, e umas canjiquinhas de restos de dentes, a tanger bois imaginários. E jamais uma chifrada levara o tangente Vicente, e aquele ponteagudo ferrão, era só pra sua pura excitação, que como a baba, não acabava.
Com efeito eu nascera numa data em que - então - se atribuía São Vicente de Paula como Padroeiro. Mas meus pais - ainda sem que o Zé Vida interviesse - acharam por bem nomear-me só Paulo, penitente - apesar da cara de Vicente.