Moça do banlon verde
Subi à cabeceira da cama. Em pura curiosidade, pelo simples prazer de trepar, acostumado que era com as delícias de um quintal arborizado - e de que agora estava privado, no recolhimento do seminário.
Se me faltavam energias para a vocação da contemplação, sobravam-nas para a da elevação, e tudo se fazia pela glória do Pai, que se comprazia. Afinal, já havia jantado, cumprido as horas de estudos, feito as orações vespertinas...
O problema era o sono que não chegava, em alguma esquina vagava, vagalumeava. E, com os pés na cabeceira do catre, alcancei a janelinha basculante, montada na horizontal, no alto da parede. Mais para o arejamento do dormitório do que para qualquer outra função que se pudesse esperar duma janela.
Olhei pro breu exterior, rampa abaixo da ruazinha apertada, calçada de poliedro, onde um ou outro passante só passava, nem parava, ia adiante. Luzes, poucas dum poste a outro e alguma janela iluminada que ainda refletia atividade no aconchego dos lares.
Mas eis que meus olhos, inda havia pouco, pios, deram-se a profanos desvios, no iluminar duma varanda, numa casinha assobradada, dum par de namorados ornada, assentados, entregues ao mais candente transporte do amor. Cochichavam, se miravam, se riam, se eletrizavam.
Num dado momento - perdoai se aqui comento - a ousada e abousada mão do jovem mancebo, num golpe ágil, deslizou-se por sob a blusa da amada, um banlon verde, que cobria aquela fada. No apalpar frenético que se seguiu, pausado às vezes por uma suspeita de que a porta para a sala fosse se abrir, - ou aquela janela basculante se estilhaçar - não foi somente o sangue que se me subiu.
E Jesus viu, sentiu, e consentiu: Ia fazer dezessete anos e num rasgo de boa vontade, me fazia entrever, deparar - e depravar - com o descortino, inda menino, das primicias e delicias da eternidade das impudicícias.