548-A FALSA GRÁVIDA - Visita na Penitenciaria

A mulher estava inquieta e mostrava-se incomodada. O barrigão denunciava uma gravidez às vésperas de dar a luz. O velho sentado no banco dos ônibus no setor destinado aos idosos, como sempre lotado, levantou-se e ofereceu o lugar à grávida.

— Sente-se, senhora.

— Não, muito obrigada. Fico melhor em pé.

— Por favor — insistiu o homem de cabeça branca.

— Num quero mesmo. — ela respondeu.

Se sentar, aí sim, que passo mal, pensou.

Sentia incomodada por todos os lados: na frente, a barriga imensa e atrás, aquela sensação de estar precisando urgentemente ir ao banheiro. A idéia da barriga de mentira foi de Margarida, a amiga que já tinha experiência de entrar e sair da penitenciária com facilidade, graças à grande almofada que amarrava na frente, fingindo gravidez.

— Com as grávidas eles não fazem muita inspeção, a gente passa fácil, fácil. — Margarida era mulher vivida.

Era a primeira vez que Delminda usava a almofada. Também já levara um celular, que não foi detectado devido ao local em que o escondera. Mas agora levava dois celulares e mais a massa epóxi, e sentia-se tremendamente desconfortável. Mas Miro fora autoritário:

— Preciso da massa epóxi pra disfarçar a barra serrada. E também preciso de dois celulares. Cê tem que trazê tudo na próxima visita.

O calor dentro do ônibus era infernal. Delminda suava e se mantinha de pé, sem fazer muita movimentação.

Se mexer demais, é capaz da encomenda sair e cair no chão.

O percurso de sua casa até a penitenciária, que ela fazia duas vezes por mês, para visitar seu nego, durava quase uma hora, Tinha de tomar dois ônibus, e aquela viagem estava ainda pela metade, havia apenas embarcado no segundo ônibus quando o careca lhe oferecera o assento.

É besta mesmo. Se ele soubesse que não posso sentar por cauda de que... Era capaz de me denunciar, mandar parar o ônibus, o escambau. Não se pode confiar nesses velhos que se metem a fazer delicadezas, são tudo safado.

Enfim, após trinta minutos de tormenta, o ônibus chega ao ponto final, que é justamente a praça defronte a Penitenciária. Com cuidado, desce do ônibus e caminha devagar, um pouco fingindo estar grávida, outro tanto pela dificuldade em andar, temendo que a “encomenda” escorregue perna abaixo.

Ao chegar à sala de inspeção feminina, onde todas as visitantes são examinadas, Margarida está exausta e não consegue esconder seu nervosismo.

— Então, neguinha, ta esperando nenê pra quando? — pergunta a inspetora, uma franzina que mal apalpa Margarida.

— Pra daqui... daqui um mês. — Ela responde, vacilando.

Outra agente na sala de inspeção olha para Margarida, dá um sorriso maroto e cochicha no ouvido da inspetora que a interroga.

— Que barriga mais esquisita! Vamos conferir no Raio-X. — A agente determinou, indicando uma porta no fundo da sala.

Margarida sentiu uma pontada.

Filha da pauta! Agora, descobre tudo.

Caminhou com dificuldade na direção da porta da sala de Raios-X. A agente atrás, agora já desconfiada de alguma mutreta, além do barrigão. Ao abrir a porta, para que a visitante grávida e nervosa entrasse, esta se deteve e disse:

— Não precisa merda nenhuma de raio- x. Eu confesso tudo.

E ali mesmo, na frente das outras mulheres que estavam sendo inspecionadas, levantou a saia, desamarrou a almofada que imitava o barrigão de grávida e, agachando-se, expeliu dois celulares e um saquinho plástico com massa cor de cinza, que escondia no reto.

ANTONIO GOBBO

Belo Horizonte, 18 de maio de 2009 –

Conto # 548 da Série Milistórias

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 25/11/2014
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