Sorte
Eles estavam lá.
Aqueles dois bons velhos conhecidos, naquele já tão bem conhecido bar apertado, onde tantas vezes virei as noites a procura da felicidade no fundo de cada copo. Nunca a achei.
Ou eles já não me reconheciam ou evitavam demonstrar, pois mal me olhavam nos olhos. E aqueles dois familiares pares de olhos estavam cheios de lágrimas.
Evitei perguntar o porquê. Talvez não valesse a pena. Aquele copo, que pela quinta vez na noite eu prometi ser o último, parecia não ter fim.
E eles continuavam chorando.
Não havia a música, exceto aquela que jamais deixa de tocar dentro de nossas cabeças. A conversa, que outrora era tão excessiva e alta, inexistia. Passei a enxergar tudo com uma névoa a minha frente, como se fosse um filme em preto e branco. O choro aumentava, o que me fazia crer que o estado etílico dos bons conhecidos estava chegando a níveis cavalares. E eles continuavam a me ignorar.
E eles continuavam chorando.
Levantei e fui ao banheiro. Parei na porta, a encarei por alguns segundos. Desisti.
Voltei a mesa e meu copo continuava cheio, tomei mais um gole.
A verdade começou a me alcançar, tentei fugir. Porta fechada.
E incansavelmente, eles continuavam chorando.
Talvez seja um sinal de boa sorte, porque no final das contas entendi.
Feliz o homem que tem bons amigos para chorar a sua própria morte.