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Chico Piaba era raro, esquivo, mas regular. Quando a estação fria se anunciava, passava pela porta, ou janela mesmo e fazia sua encomenda: meias velhas para fazer cobertor. Sua especialidade. E parecia que nem a Conferência de São Vicente de Paula, que cobertores aos mais necessitados distribuía, atenção ao Chico fazia. Mas também pudera, vivia lá pelos cafundós, e vai ver, muito a sós.

Já o Tião Fundão, ainda mais raro, vivia cheio de precisão, mas com aquela voz afinada coragem pra pedir era nada. As gentes boas é que lhe entendiam o sofrer e alguma coisa, hora ou outra, tentava fazer. E corria que era da tuberculose que o Tião padecia e contato direto com ele o que mais se temia. Enquanto isso, tossia.

E o Sodré, que vinha a cavalo, veio uma vez, solamente una vez y nada más. Fazia lembrar um pouco a imagem dos ensebados forasteiros nos filmes de caubói e seu sorriso, com todos os dentes empapados por uma camada de tártaro, já antiga era, contudo, expressão amiga. Por um prato de comida, ou cousa parecida. Além da prosa, o cigarrim de palha. E a partir daí, a memória se atrapalha.

Fecha-se o quarteto com o Lizico, imundo e sorridente, fazendo suas palhaçadas para a circunstante gente. Achou bom poder dormir no galinheiro desativado na casa de vovó. Five-star, ao luar, e de galo poder sonhar. Tinha aquele braço amputado, num toco de ante-braço que o fazia engraçado, palhaço consumado. Mostrava a todos sua proeza de riscar um fósforo com a caixinha alojada no toco de ante-braço que lhe restava. E fogo, a imaginação pegava...

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 26/10/2014
Reeditado em 08/02/2024
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