Os Errantes (2ª Ponte)

Esta ponte é bem maior do que a primeira, no entanto bem mais estreita. Tivemos que passar um de cada vez porque ela parecia não suportar o peso de duas pessoas. Eu fui o primeiro e conforme eu me aproximava do outro lado, mais escuro ficava, até chegar ao ponto de não ver nada que estivesse há mais de um palmo de distancia.

Mais adiante, eu tropecei em uma pedra e caí. Foi quando eu percebi que havia cruzado a ponte, então gritei a minha chegada ao meu guia, para que ele também pudesse atravessar.

Ele trazia consigo uma tocha comum, mas que iluminava como uma fogueira, estávamos em um vale escuro, com um cenário afeiçoado a coisas tristes, árvores ressecadas, cinzas pelo chão, pedras banhadas de sangue e ossos por todos os lados. Ali o silêncio era profundo, eu podia até ouvir as batidas do meu coração.

Caminhamos bastante por aquele vale desolado até aparecerem os primeiros seres vivos, pessoas que caminhavam lentamente, vagando à deriva como zumbis, esbarrando-se uns nos outros sem ter a consciência de onde estavam ou o que faziam ali.

Azrael estendeu a mão e com a tocha foi abrindo o caminho entre os indolentes. Andamos até um despenhadeiro onde ventava forte, podíamos notar que lá em baixo haviam pessoas inquietas que constantemente se deitavam e se levantavam como se algo as incomodassem.

Perguntei ao meu guia: Que lugar é este, escuro e lerdo, estranho e tranqüilo em que pela segunda ponte chegamos? E ele me respondeu: Aqui estão aqueles que vistes se deitando e dormindo à caminho do purgatório. Este é o lugar dos ociosos, os que em vida foram consumidos pela negligencia e pela preguiça.

Aqueles que vês lá em baixo, estão querendo descansar, mas aqui, nada cede lugar à preguiça. O chão está um pouco quente para se deitar ou até mesmo se sentar, por isso estão tão perturbados, e assim ficarão até que se acostumem a se deitar em brasa. ...Se é que isto é possível?

Por alguns minutos ficamos ali observando o sofrimento daquelas pobres almas, até seguirmos pelo lado estreito do despenhadeiro, um caminho pelo qual haviam centenas de serpentes se arrastando de um lado para o outro e para onde quer que olhássemos, lá estavam eles se entrelaçando, atacando umas as outras.

Azrael me encorajou a passar quando falou que elas só atacariam aqueles que de fato fizessem jus a este lugar. Foi de arrepiar senti-las passando sobre meus pés, frias e gosmentas, uma picada seria fatal porém, passamos tranquilamente sem sofrer nenhum ataque.

Chegamos então há uma enorme escadaria que tinha cerca de dois mil degraus, aquele era o caminho para a terceira ponte, em volta das escadas estavam pessoas que curiosamente não tinham pálpebras em seus olhos.

Segundo Azrael: aqueles que de alguma forma se acostumam com a agonia e conseguem dormir por alguns instantes neste lugar, logo são surpreendidos por algozes que impiedosamente arrancam-lhes as pálpebras afim de que não voltem a sossegar.

Estes estavam próximos à saída, porém não tinham disposição suficiente para subirem as escadas, no entanto subimos nós cuidadosamente, pois a escadaria era de pequeno espaço e cheia de curvas, sem bordas e provida de fortes ventos e escuridão em torno de si. Uma queda poderia resultar no fim de nossa jornada e na minha passagem definitiva ao inferno.

Após percorrermos um terço de nossa subida, a tocha que conduzíamos se apagou devido aos fortes ventos, o que tornou ainda mais difícil a nossa escalada. Azrael subia na frente me guiando, mas logo fui perdendo o contato com ele.

Não me sentia cansado nem tão pouco desencorajado, porém não conseguia acompanha-lo. Atencioso e quadrupedante, segui vagarosamente até o topo. Ao termino da minha subida, o encontrei sentado à minha espera para que por vez, atravessássemos a terceira ponte.

...Continua em: Os Errantes - 3ª Ponte.

James Gallagher Junior
Enviado por James Gallagher Junior em 11/08/2014
Reeditado em 15/06/2018
Código do texto: T4918766
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