Quase meiga
O facão em punho e os cabelos desgrenhados davam-lhe um ar ameaçador à primeira vista. Sobretudo, ali no meio do matagal, a podar furiosamente a ramagem mais seca.
Já a um bando de assustados garotos, vencido o susto inicial, aquela
figura negra, de dentes protuberantes e olhos mortiços, despertava mais curiosidade. E, cautelosa, mas curiosamente, foram-se aproximando, ainda que guardando uma respeitosa distância, enquanto iam fazendo, tentativamente, perguntas ao desbravador solitário.
Ao como você chama, Aristeu, respondeu. De forma desarticulada,
fragmentada, tanto pelo estado suarento, quanto pela concentração principal que era cortar a lenha pra mãe, Dona Sinhana Salvador.
Passou por outras perguntas mais com exemplar esforço e mais exemplar
tolerância àquela criançada abusada. Mas no fundo, quiçá, não desgostasse a atenção que recebia, enquanto o facão brandia.
Inelutavelmente, veio-lhe uma pergunta difícil: quantos anos cê tem?
Tirou o chapéu, coçou a testa empapada de suor e respondeu: farta um pra quarenta. E continuou a labuta, sem se dar conta do quá-quá-quá silencioso e cumplicioso da garotada.
Com pouco, pressentindo a preocupação de Dona Sinhana, pegou o seu
feixinho de lenha fininha e retornou a casa, entrando pelos fundos dum
quintal abatumado e escurecido.
Os meninos, ainda impressionados com a simplicidade quase meiga daquela figura, ainda fizeram um pouco de hora explorando o matagal, a caça de frutinhas e confusões, até que uma chata e tagarela dona Ana, de um quintal contíguo e muito antigo os escorraçou.