AMOR À PRIMEIRA VISTA

Verão de 1978, a fim de curtir alguns dias de férias na praia, aluguei com dois amigos uma pequena casa de dois quartos em Boiçucanga, no litoral norte de SP.

Chegamos sexta-feira à tardinha, após abastecê-la com bebidas e comidas, demos uma ajeitada na casa empoeirada. Com tudo pronto, de banho tomado e arrumados, fomos ao centro da vila saber sobre as festas e eventos dos locais mais badalados da cidade.

Bebemos alguma coisa e nos informamos sobre a programação.

A noite chegou, cansado, já um pouco alcoolizado, estava precisando dar uma relaxada, uma caminhada na maré. Meus amigos resolveram ficar na padaria do curvão bebendo e papeando.

Uma linda noite se apresentava, devido a pouca luminosidade da cidade, o contraste era muito grande, podia-se ver o manto celeste cintilando, uma beleza. Caminhando descalço na maré, escutava o mar se deter em espumas brancas nas areias.

Sentir a leve brisa marinha a afagar minha face me relaxava. Aos poucos a minha visão foi se adaptando a escuridão, passei a enxergar um pouco mais a distância. Eis que vejo algo grande e claro à frente, bem próximo à maré, curioso me aproximo, vejo alguém deitado, de vestido longo, na areia, até pensei em me desviar, mas como estava em meu caminho continuei, vislumbrei uma jovem moça em prantos.

Perguntei se poderia ajudá-la, soluçando muito ela não conseguia me responder, eu disse-lhe para sair dali, pois a maré estava subindo e poderia molhá-la. Estendi a mão e a ajudei segurando-a pelos braços, com um pequeno esforço a coloquei em pé. Passei o meu braço por sobre os seus ombros, rodeie a minha cintura com o seu braço e abraçados nos dirigimos à vila. Durante esse trajeto, senti o suave perfume almiscarado exalado de seu corpo. Ao sentir minhas mãos em seus contornos, permitido por suas vestes leves que se moldavam as suas formas, meu coração começou a acelerar no compasso da paixão. Seus longos e volumosos cabelos castanhos em desalinho, cobriam quase que totalmente o seu rosto e o meu.

Caminhamos em silêncio até chegarmos a rua principal, por mim, passaria a noite inteira caminhando abraçado com aquela criatura divina. Quem seria? Já sob a iluminação pública, perguntei-lhe onde morava, lentamente ela levantou a cabeça e com as mãos, em movimentos suaves e precisos, ajeitou em nó os seus cabelos nas costas, mas não me respondeu. Ao vislumbrar seu lindo rosto em lágrimas, o mais encantador que os meus olhos já viram, meu coração parou, minha respiração cessou, meu corpo passou a não me obedecer, dos meus lábios as palavras não passavam, fiquei hipnotizado. Ela olhando-me nos olhos disse que não queria ir para casa, pois lá se encontraria com a razão de seu desgosto. Ela disse-me que queria apenas caminhar e conversar. Solícito lhe ofereci a minha companhia, como um sim, ela estendeu os braços e mostrou-me as palmas de suas pequenas e delicadas mãos.

Muito feliz, estava sentindo na carne aquilo que nunca, jamais em tempo algum acreditaria; O amor à primeira vista.

Escutando tudo que a boca daquele anjo me dizia, andamos por aproximadamente uma hora, pareceu-me um milésimo de segundo.

Pensei em tudo para protelar a nossa separação, quanto mais eu ficava, mais me encantava com essa criatura que o mar me mandara.

Sem ao menos perguntar o meu nome, ela quis saber onde eu estava hospedado, contei sobre ter alugado uma casa com mais dois amigos, ela disse que precisava ir até lá, se eu poderia levá-la, eu entendi e partimos. Lá chegando entrei primeiro para ver se havia alguém..., ninguém... Ao entrarmos, logo lhe mostrei onde ficava o banheiro. Enquanto ela não voltava, ajeitei melhor o ambiente para lhe oferecer algum conforto. Ela apareceu na sala, sorridente, estava mais linda ainda, convidei-a a sentar para conversar, ofereci-lhe até o que não poderia lhe dar naquele momento, ela aceitou beber um copo de refrigerante. Sentindo a minha preocupação, ela mostrou-se muito sensível, instruída e inteligente, ao tecer seus comentários sobre a necessidade de descontrair ambientes ocupados por jovens, isso me deixou mais a vontade e relaxado. Perguntei-lhe se ela gostaria de comer algo, ela disse que sim, fomos à pequena cozinha preparar algo, eu estava gostando muito, ela ao meu lado me ajudando com os alimentos, às vezes roçava seu corpo macio no meu. Eu estava rindo a tôa, louco de excitação, mas estava com uma deusa do meu lado, nem pensaria em me insinuar, pacientemente, deveria esperar.

Preparamos algo rápido e leve com os legumes e as verduras que cozemos, ofereci-lhe algo mais substancioso, mas ela me disse que era vegetariana. Levamos o preparado para a mesa e nos servimos.

Não toquei na comida, fiquei como um tolo olhando intensamente para a minha sereia. Sentindo o meu torpor, ela, em meio a vigorosas garfadas ria muito, de seus lábios carnudos emoldurando seu belo sorriso, disse-me que tudo estava ótimo, perfeito, perguntou-me se eu não iria comer, eu disse que não tinha fome naquele momento e que, se ela quisesse poderia comer a minha parte, ela sorriu e me disse que chorar lhe dava muita fome, eu ri muito e concordei. Mais descontraído resolvi brincar um pouco com ela, coisa de crianças ou apaixonados, com o garfo eu espetei alguns legumes e mandei-os em voltas de “aviãozinho” para a sua linda boca carnuda. Que loucura, parecia bobagem, mas foi muito divertido e excitante. As horas foram passando muito rápido, eu não tinha como frear o tempo, sentados no sofá ficamos conversando sobre nossos sonhos e bobagens de amor, até que suas pálpebras lentamente foram fechando ao sono. Ajeitei-a ao meu lado e fiquei agradecendo ao divino por seu envio.

Um de meus amigos chegou alcoolizado, acompanhado de uma linda moça, pedi-lhes que fizessem silêncio, eles beberam alguma coisa e foram para o quarto menor, se trancaram e lá ficaram.

Preocupado com ela, levei-a ao quarto maior e a coloquei na cama, um facho de luz tênue que vinha da sala invadiu o quarto e a iluminou, parecia um anjo dormindo, fiquei louco de amor por aquela moça, estava flechado, e agora? Para o seu conforto tirei-lhe as sandálias, meu D’us, tive a vontade de beijar e morder aqueles pequenos e macios pés, quanta beleza concentrada numa só mulher.

Fiquei alternando minha ansiedade entre o quarto e a sala. Numa das vezes vi seu corpo iluminado, agora só de calcinha e sutiã, que loucura, que perfeição. Fiquei no quarto com a porta semi-aberta, como um guardião as ordens de sua princesa. Enfim, deitei-me ao seu lado, sentindo o seu calor e seu perfume inebriante acabei dormindo abraçado a ela. Ao acordar pela manhã, ela já não estava mais ao meu lado, levantei-me num salto e fui para a sala. Dormindo no sofá, estava o meu outro amigo sozinho, fui até o quarto menor e ali se encontrava o casal dormindo. Corri até o banheiro, e nada, fui até a cozinha e vi vários sanduíches prontos, um suculento omelete de legumes, a louça toda lavada, e nada dela, nenhum vestígio, só de seu perfume que ficou impregnado em meu lençol, fronhas e minha camisa. Desolado, deitei-me onde ela havia dormido e comecei a pensar se tudo aquilo não havia sido apenas um lindo sonho, tentei dormir, não consegui, estava num estado de excitação pulsante. Levantei-me e resolvi acordar todo mundo; comecei pelo que estava dormindo no sofá, após esbravejar ele me perguntou o que eu queria, eu lhe perguntei se ele havia visto uma moça de vestido tipo indiano, ele riu e disse que não, mas que gostaria de ter visto. Irritado mandei-o "tomar banho" e dormir de novo. Fui ao quarto pequeno sentei-me na cama e, com cuidado, acordei o meu outro amigo, fiz-lhe a mesma pergunta, para o meio alívio ele disse que sim, que havia visto ela junto a mim no sofá quando chegou a noite. A moça que estava deitada ao lado de meu amigo, escutou a conversa e me disse que, quando foi ao banheiro pela manhã, viu uma linda moça na cozinha e a cumprimentou. Contou-me também que ela perguntou o meu nome, mas ela não sabia, disse-lhe que seu nome era Corine, que havia gostado muito de mim e que voltaria para me ver. Fiquei horas entrevistando aquela moça, querendo saber mais detalhes, impressões sobre os poucos instantes que estiveram juntas, a moça disse-me que teve a impressão de que ela voltaria para mim e que, gostaria muito que alguém tivesse esse sentimento por ela; de amor à primeira vista.

Sábado e domingo, não participei de nada com meus amigos, corri os quatros cantos da vila a procura de alguém que a conhecesse, ou soubesse o seu paradeiro. Deixei recados e telefones em pontos estratégicos da cidade. Muitos anos se passaram, com amor eu a tenho sempre na memória. Depois desse episódio, passei várias férias em Boiçucanga, caminhei atento pelas praias em noites estreladas, bem próximo da maré, na esperança que Iemanjá mande a minha linda sereia de novo. Hoje, após todos esses anos, tenho o habito de caminhar pela maré todas as manhãs em praias próximas a minha residência, sempre me dá grande prazer lembrar daquele momento sublime, as vezes único em nossas existências.

ZIBER
Enviado por ZIBER em 09/04/2007
Reeditado em 04/08/2014
Código do texto: T443589
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