Pesadelo

Noite

Deitado na grama eu podia contemplar as estrelas acima de mim. Era uma linda noite de verão. Nunca em toda a minha vida havia sentido tanto medo. O carro acabara de cair no precipício. Eu estava jogado sobre a grama com dores por todo o corpo. Minha cabeça não podia pensar em nada além da equipe de socorro que chegaria, assim que alguém passasse por ali, visse o carro e me visse. Não sei quanto tempo fiquei com as costas latejando e imóvel. Sei apenas que eram sete da noite quando fiz a curva a cento e cinquenta por hora e perdi o controle do veículo. Daí em diante foram só trevas. Devo ter rezado todas as orações que conheço e ter cantarolado baixinho todas as músicas de que me lembrei, pois o socorro chegou apenas ao raiar do dia na forma de pescadores que passavam por ali àquela hora.

Manhã

Às oito horas da manhã eu estava agonizando devido ao longo percurso que faziam arrastando-me numa velha rede carregada por dois homens. Gritaria se não estivesse com uma mordaça. Daria meu relógio de ouro para saber quem diabos eram aqueles. Daria qualquer coisa para que me levassem a um hospital. A dor aumentava à medida que eles desciam o desfiladeiro. Antes de chegar ao meu destino desmaiei. A escuridão me salvou de ver o caminho.

Tarde

Às duas horas acordei. Ouvia choro à minha volta. Estava amarrado de pés e mãos. Um homem calvo e gordo aproximou de mim outra rede dentro da qual dormia uma criança amarelada e barriguda. A um gesto seu a rede foi levada para outro canto do galpão. Percebi que todos ali temiam aquele homem. Temi por minha vida. Durante toda a tarde ouvi conversas e choros baixos. Deram-me algo amargo para comer. Eu resisti. A fome foi maior. Quando acordei no fim da tarde, havia grande concentração de gente do lado de fora. Resolvi relaxar e estiquei as pernas. Senti uma pancada contra minha nuca. Ainda pude ver o rosto de quem me acertou. Havia misericórdia naquele olhar.

Manhã

Dormi a noite toda. Quando acordei estava rodeado de pessoas às margens da rodovia. Levaram-me ao hospital, rebocaram o que sobrou do meu carro. Fui para o conforto de minha casa. Minhas costas nunca estiveram tão boas. Ainda hoje recordo vagamente do que me aconteceu. Tenho memória fraca. Volta e meia eu sonho. Sempre o mesmo sonho. Sonho que estou dirigindo e uma menina atravessa a pista. Eu a atropelo e mato. Logo depois eu morro. Quando estou morrendo eu acordo...

make
Enviado por make em 27/11/2012
Reeditado em 23/01/2017
Código do texto: T4006822
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