Um conto erótico

Acendeu o primeiro cigarro da manhã como se do desenrolar do dia e dos fatos não muito se importasse. Tomou seu banho matinal e vestiu suas roupas íntimas. Deixou os cabelos pretos semi presos, meio mal arrumados, com um certo charme como era de costume. Passou seu melhor batom, vermelho, perfeito para contrastar com a pele branca e os olhos azuis. Tomou uma boa xícara de café amargo, sem açúcar. Saiu pela rua, foi viver.

Andou por ruas antigas e estreitas, divertindo-se com a diversidade de pequenos antiquários escondidos entre as sombras dos prédios tombados pelo patrimônio histórico da cidade. Comprou um doce numa confeitaria, lambeu os dedos limpando o chocolate escorrido. Sentiu prazer. E caminhava meio a esmo, procurando por algo que nem mesmo ela sabia.

Entrou numa pequena loja de artigos esotéricos, comprou um pote de pétalas perfumadas. Cheirou-as exalando o cheiro das rosas. Deu voltas no quarteirão, comprou mais alguns livros de culinária. Decidiu ir trabalhar. Virou a esquina. Pegou o ônibus em direção a Zona Sul. Esquivou-se durante a viagem nos bancos traseiros da viação rabiscando anotações nos livros comprados. Ficou a imaginar delícias prontas em sua cozinha. Sentiu prazer.

Entrando num edifício grande e longilíneo, apertou os botões do elevador que a levariam até seu andar e já alguns minutos atrasada, entrou em sua sala em silêncio, sem ninguém a cumprimentar. Sentou-se a sua mesa, ligou o som e enrolou longas horas do dia, simplesmente se deliciando com seus pensamentos perdidos no olhar...

Respondeu alguns e-mails. E a um em especial se dedicou melhor. Ele queria encontrá-la aquele dia, sem meias palavras. Para já, para ontem. Ela disse que iria. Acendeu mais um cigarro, foi para a janela, ficou a contemplar o ir e vir de pessoas no calçadão lá em baixo. Jogou suas cinzas neles. Riu. Adorou passar um dia a vagabundear entre tantas pilhas de trabalho.

Pegou as escadas, quis descer sozinha, sem ter ninguém para dividir seu espaço. Sem ninguém para desejar um bom final de dia. Saiu clandestinamente pelos fundos, deu de encontro com um antigo amor. Sorriu sonsamente de lado, acelerou os passos e pegou o metro.

Segurou-se nas barras de metal da condução, pensou algumas insanidades meio torpes, meio sensuais. Olhou um homem a sua frente, sentiu-se excitada. Já estava quase na hora...

Desceu, entrou na rua das boêmias, deu sorrisos para as flores. Adorava elas. Jogou beijos aos rapazes. Já tinha destino certo.

A noite caiu, ela parou um pouco para ficar olhando a lua. Deu uns uivos pelas esquinas. As garras já estavam afiadas. Entrou no prédio antigo, subiu as escadas. Apertou a campainha. Apoiou-se de lado e esperou que ele a atendesse.

Estava com um rosto bonito, como se lembrava da última vez (já há algum tempo atrás), ele sorriu gesticulando para ela entrar. Jogou-se em seu sofá. Abriu as pernas. Olhou para ele. Não deixou que a tocasse. Acariciou-se. Sentiu prazer. Ele também. Acariciaram-se juntos. E beijaram-se elevando-se a lua. Ele entrou nela e ela ria em silêncio, num riso meio triste porque apesar de gostar do que sentia não amava o que estava sentindo.

Lembrou do outro. Fez de conta de ele o era. Fechou os olhos enquanto tudo acontecia. Imaginou cenas antigas e de repente... De repente o presente mostrou-se até mesmo agradável. Voltou para ele. Arranhou-o. Derrubou as estrelas. Abriu a boca, engoliu o anil. Arranhou víceras e entranhas. Fez cara de estranha, jogou a cabeça para trás deliciando-se com muito prazer. Lambeu os lábios. Relaxou a musculatura. Deixou que ele terminasse. Olhou as horas. Colocou sua roupa e foi embora sem nem mesmo dizer adeus.

Clarice Ferreira

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