Expulso de uma Fábula

Nascido em uma fábula, expulso da mesma.

Ele sentia ser real demais para toda aquela atuação ilusionaria.

E por vezes até fora.

Tão impassível de regras, tornou-se oposto. Oposto a tudo aquilo que sempre repudiara. E tornou-se menos, matando a si próprio.

Olhava para aquele mundo privado com curiosidade e sempre a distancia, por detrás dos arbustos, pelo buraco da fechadura.

Aquele mundo brilhante de poucos. Onde penduram adornos pelo pescoço em menção de poder, onde o que é não é, sendo hoje o ontem, onde ainda ha sangue azul.

Diga-me quem é seu pai, e assim saberei tudo sobre ti.

Beba – diziam. Fume, minta e comporte-se. Seja um bom garoto e respeite os mais velhos, acima de tudo. Não são sábios, mas são velhos, e passaram uma vida inteira sem fazer nada plausível e por isso merecem respeito.

Falavam uma língua incompleta e exigiam compreensão. E ele não os compreendia, tendo assim ficado mudo. E mal sabia que silêncio também era diálogo. Diálogo sobre aquele que perdeu a vontade de dizer.

Ele não disse, e tendo não dito o compreenderam:

Não um de nós. Pensaram.

Não um de nós. Agiram.

E viraram as costas para aquele curioso diferente.

Ele enlouqueceu, buscando tudo aquilo que não encontraria por ali. E não encontrou metade daquilo que buscava. Mas, foi atrás.

Percorreu um mundo normal, quase fez-se um. Viveu.

Enxergou a vida com pupilas dilatadas, e quase acreditava poder ver mais.

E a cada nova dose, a cada nova ponta descartada, era um quilometro caminho oposto. Oposto daquilo que sempre fora, mesmo nunca sido.

Aprendeu a ser sociável, conheceu vidas, encontrou estradas e perdeu-se em multidões.

Sorriu.

Então um dia voltou a olhar pela fechadura, reencontrando seu eu perdido. Tudo estava imutável, aquele mundo proibido jazia igual. E ele mais do que nunca era um paradoxo. Olhando pelo buraco da fechadura de ouro reluzente, viu-se por um instante refletido: Rugas profundas e marcas do tempo.

Continuando ali assistindo em silêncio a dança daquele povo parado no tempo, concluiu:

Imortais.