A IMAGEM DO ESPELHO

Quando dei por mim lá estava aquele galego olhando-me com dois olhos azedos.

Pensei só com e para mim, nem meus botões deixei perceberem a estranheza do fato. “Caramba! Moro nesta casa desde... desde que nasci! Vejo minha mãe todos os dias, quase a toda hora; e meu pai... quando ele chega á noite com cheiro de cana!”

Conheço cheiro de cana, pois no nosso quintal tem uma touceira, e outro dia minha mãe descascou uma e me deu um pedacinho, do qual adorei o cheiro, mas não gostei de chupar, pois é muito dura.

Pois bem, sempre vi minha família completa: pai e mãe; ah! E eu no espelho... Minha mãe me mostrou. Mas aquele par de olhos azuis nunca tinha visto, tenho certeza!

Nunca reparei nos olhos de meu pai, também como? se nunca nossos olhos estão no mesmo nível. Já os de minha mãe são azuis iguais aos meus; lembro bem quando vimos nós dois juntinhos, refletidos na imagem do espelho.

Agora fazendo uma retrospectiva da minha imagem refletida no espelho: AVE MARIA! Ele é minha cara cuspida e escarrada!

Apesar do susto me agarrei mais ainda á barra da saia de minha mãe, joguei a perna esquerda á frente (sou destro, os destros levam a perna esquerda á frente primeiro), fiz um esforço acima da minha capacidade para equilibrar o corpo e forcei a perna direita para ultrapassar a esquerda. Assim cambaleando (como meu pai, quando chega á noite), caminhei grudado à minha mãe, bem do lado de uma de suas pernas, deixando as duas pernas dela entre eu e aquela minha assombração.

Depois de uns oito passos desequilibrei-me, ia caindo, minha mãe segurou-me pelo braço; e ao aprumar virei-me para trás... E gargalhei gostoso. Caído debruço, balançando as duas pernas no ar e um emaranhado de cabelos loiros, lá estava minha réplica. Réplica? Espera aí! Então não é fantasma.

Ainda não sabia falar, fiz mil e um trejeitos para minha mãe se voltar e ir socorrer meu irmão gêmeo!

Só tínhamos onze meses de idade.

ALEIXO (outubro/2012)