ANDAIMES PARA KAFKA

ANDAIMES

Ratos roem caixas de livros no escuro. Mal iluminada, a sala alonga-se corredor sem fim. Por uma porta a vista alcança a fila de prateleiras que se equilibra no vazio, sobre a cidade. Alongo meu corpo nu e vou além do orgasmo solitário, olhos pregados no vulto que não distingo daqui.

Melhor que se feche essa porta, os navios estão partindo do estaleiro numa ordem que se faz urgente compreender dada a complexidade das linhas estabelecidas desde Marco Polo.

São um misto de água e ar as vias percorridas. Os barcos seguem em “T” e os balões em “C” - o mapa das rotas garante organograma que faz inclinar o plano para que seja permitido, aos organizadores do comércio mundial, o controle da chegada.

Ao receber a âncora desse transporte megatrônico uma funcionária magra e tailandesa nos ensina com paciência a destreza da seleção do momento certo em que deve prender as alças que pendem e fixar a embarcação à terra firme.

Tudo está garantido no mundo, fez isso à vida toda. Repete a manobra. Ficamos sabendo, então, que ela não pode fazer mais que garantir o próprio sustento.

A volta do percurso se faz sobre o mesmo vazio. Entre prateleiras sobre os livros, num elevador que desliza em cordas de metal. É possível comprar ácido prússico ou Nitroglicerina em tonéis, ficam armazenados em prateleiras também. Andares gigantescos, os navios parecem deslizar na flor da água.

A vossa excelência, presente em toda célula, em cada sala, em todo silêncio enfim ordena.

_ A fila deve ser organizada segundo a importância da função, a cada vinte e oito dias.

Sou promovido, mas não chego a tempo de ver o show do Simply Red. Penso na infelicidade verdadeira da fã de verdade que chora a ausência de um autógrafo.

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 01/08/2012
Reeditado em 05/08/2014
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