Entre "versos íntimos"
Entre “versos íntimos” José chora. Chora sua dor e a dos outros pelo simples fato de haver tantos como ele, apenas José; nascidos do carbono, da lama, do sangue, do gozo. Com as mãos trêmulas erguidas para o céu pede seu alívio tardio, deseja o descanso putrefato da carne, alimento dos vermes. José enxuga as lágrimas do rosto embrutecido pela necessidade de ser fera, devora o passado com a intenção de a ele retornar e viver tudo outra vez, entretanto a lucidez (âncora de José) não o deixa voar. Sabe que tantos outros, assim como ele, têm desalento e esperança, trabalham como homens condenados a carregar uma enorme pedra morro a cima morro abaixo, pois ganham, perdem e recomeçam. Navegantes do destino, arbitrário juiz de punho de aço que não faz distinção entre suas vítimas, pobre, rico, preto ou branco. Como um louco José chora, e ao mesmo tempo ri de si; relembra que sempre quis ser uma pessoa sábia, entretanto a sabedoria é uma qualidade que só chega quando não mais precisamos dela. Aos 97 anos José é um sábio que não anda, não dança, não mastiga, não cospe, não bebe, não fuma e não transa. Neste momento a única necessidade de José é que a morte deixe de ser intermitente e carregue-o em seu manto negro .