E não é que o famoso engenheiro mecânico especialista em biomédica, Harold Wolfgang, PhD, inventou um Felizmômetro? 
       Os caríssimos leitores, se tiverem o mínimo conhecimento do processo de formação de palavras, já devem ter percebido que o neologismo técnico deve se referir a um aparelho para medir a felicidade de alguém. E é justamente isso que o negócio faz! O Doutor Harold Wolfgand recebeu vários prêmios pelo seu trabalho com a Ressonância Magnética Funcional (Functional Mangetic Resonanc Imaging – fMRI)aparelho que, recorrendo à imagiologia, permite observar in vivo as zonas que vão sendo ativadas no cérebro ao longo de um período de tempo, inclusive a área responsável pela felicidade. Agora, o digníssimo doutor nos presenteia com o Felizmômetro, ou fMRH (Functional Mangetic Resonanc Happiness – fMRH), instrumento utilíssimo para a humanidade, visto que, por meio dele, se pode quantificar a felicidade presente naquela área detectada pelo fMRI. Não é ótimo? Imagine você andando pela rua e alguém lhe pergunta: como vai? Você responde: 71,11% feliz! Além disso, depois de testada e confirmada a eficácia do aparelho, finalmente teremos condições de responder a antiquíssima pergunta que persiste desde o aparecimento dos cifrões: afinal, o dinheiro traz ou não traz felicidade?
         Foram dois os voluntários que se apresentaram para a pesquisa: de um lado, o ilustre empresário milionário da indústria farmacêutica, Haroldo Lobo, 1.85, corpo de squaches e natação, cabelos prata-metálicos e um sorriso largo estampado nas fotos das magazines. Do outro, a desconhecida empregada dele, dona Abacília, baixinha, braços de salgadeira e barriga de macarrão, cabelos de palha de aço e um rosto de dar dó.
       O convite para participar da pesquisa partiu do patrão:
       - Ora, vamos lá, Lia, esta é a oportunidade de você ficar famosa.
       E ela foi. Mais pelo emprego do que pela fama.
       Como era de se esperar, as revistas mais famosas e confiáveis de medicina estiveram presentes, a Herald of Medicine enviou uma equipe de seis digníssimos cientistas para validarem a qualidade do experimento que seria transmitido ao vivo para todo o mundo.
       O primeiro submetido ao fMTH foi o senhor Haroldo Lobo. O túnel cilíndrico, aos poucos, ia deslizando, envolvendo o corpo dele. Diante do rosto, numa pequena tela de LED, apareciam imagens das cenas que o fizeram mais feliz, de acordo com a informação prévia que ele tinha fornecido aos pesquisadores: a primeira Ferrari, o apartamento em Dubai, a aquisição da indústria Máximo & Máximo... Os curiosíssimos cientistas, empresários e jornalistas fixavam os olhos nos dígitos fora da sala do exame, que indicavam o índice de felicidade de Haroldo Lobo. Finalmente o resultado foi apresentado: 66,66% feliz! O empresário saiu da sala estampando um sorriso largo, recebendo os cumprimentos dos amigos e presentes:
       - Parabéns, doutor Lobo! Ótimo índice, ótimo índice, o doutor é realmente muito feliz! Bem acima da média!
       Logo depois entra Abacília, toda desajeitada e morrendo de medo daquele buraco esquisito que engole as pessoas: “eu, heim, que trem doido, sô” disse ela, enquanto era envolvida pelo Felizmômetro. As imagens que foram apresentadas a ela foram o primeiro Micro System que ela comprou em 12 prestações fixas, a sua vira-latas Lili e a primeira vez que viu o mar em Guarapari.
      O resultado pareceu demorar uma eternidade, até que um sutil alarme avisou o término do exame: Dona Abacília, ou Lia, como era conhecida, era 94,44% feliz, ou seja, 27,78% mais feliz que o Sr. Haroldo Lobo, que, com olhos estatelados e queixo caído, disse resmungando “Essa porra dessa máquina não funciona”. É lógico que o jornalista que conseguiu gravar esse comentário, um verdadeiro furo sonoro, desistiu de divulgá-lo, perdendo com isso uma matéria que talvez alavancasse sua carreira. Porém sua  omissão lhe rendeu dinheiro suficiente para comprar um apartamento em Miami Beach e viver um tempo razoável até que uma bala perdida encontrasse seus miolos.
       Pois bem, o notório empresário Haroldo Lobo era então mais infeliz que sua empregada pigméia? Aquela invenção só poderia ser uma geringonça e, ah, com certeza isso ele provaria, nem que tivesse que gastar o último centavo de euro de toda a sua fortuna, ou pior, nem que tivesse que parar com todo o investimento em pesquisas para a cura de doenças horrendas, sim, faria isso se não provassem por A + B que houve algum problema, uma arruela solta, um software com vírus, uma tecla acionada indevidamente.
       Naquela noite, o empresário não conseguiu dormir direito, embora chegou a tomar três comprimidos top de linha de sua indústria, o Placex. Mesmo assim, durante o leve cochilo, teve um baita pesadelo: sonhou com a cara gorda de dona Abacília, agigantada pelo potencial onírico, dando retumbantes gargalhadas, devorando-o aos poucos. No céu da boca, ele via refletidos os rostos secos de africanos, crianças, adultos e velhos, os ossos das mandíbulas à mostra, com sorrisos escancarados e olhos brilhantes.
       Alguns dias depois Haroldo demitiu Lia.
      Ela, após quatro meses, podia ser vista na fila do seguro desemprego, com seu linguão volumoso para fora  lambendo um sorvete. Não havia contudo, uma forma empírica de se comprovar se ela estava menos feliz, pois o Felizmômetro foi declarado, através de diversas constatações acadêmicas, uma máquina cujos resultados possuíam uma margem de erro muito grande, cerca de 40% para mais ou para menos. Não podia, portanto, ser empregado para diagnósticos precisos em medicina, área tão importante para o bem-estar de qualquer ser humano.
Well Coelho
Enviado por Well Coelho em 01/01/2012
Reeditado em 22/01/2012
Código do texto: T3416845
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