A VISÃO DE UM RATO

A visão de um rato

Ele conversava com seu amigo de gaiola havia muitos dias. Não sabia como tinha ido parar ali. Era tudo tão diferente de onde ele viera. Era uma casa maior, com seus irmãos e outros amiguinhos. Até que umas mãos calçadas com umas luvas de couro, abriram subitamente a porta da casa deles e o levaram. Primeiro ele ficou assustado, com medo, sem saber o que ia acontecer. Depois foi colocada numa espécie de caixa lacrada com um cheiro de papelão. Só tinha alguns buraquinhos para respirar. Estava completamente só, pela primeira vez na sua vida.

Soube que saiu daquela caixa de papelão e foi para outra gaiola, agora estava só. Ele via que as mãos que o capturaram de sua casa não eram as mesmas. Agora estas mãos não calçavam luvas de couro. Eram mãos femininas, jovens. Ela o apanhou docemente e até passou docemente seus dedos por sua cabeça como se estivesse ensaiando um carinho. Até que ele não viu mais nada e desmaiou. Sentia um cheiro forte, que lhe dava um fraqueza, um torpor, como se estivesse anestesiado.

Quando começou a abrir os olhos com muita dificuldade, observou surpreso, que muitos pares de olhos diferentes o examinavam. Todos os corpos eram jovens e metidos em jalecos brancos. Estava cercado por muitos humanos, parece que a chefe era a dona daquelas mãos macias. Como sair dali? Já tinha sido pregado em uma das patas, sentia-se deitado numa placa de cortiça, pois a dor era fininha e aguda.

Aproveitou um momento de distração de um dos alunos que ia pregar o próximo grampo em uma de suas patas, e saiu mancando e correndo por cima da bancada, enquanto surpresos, os alunos e a professora de Biologia gritavam em coro: - O rato fugiu.

No corredor uma multidão de alunos saía das salas, pois soara a sirene, marcando o final de um tempo de aula, o ratinho assustado, misturou-se entre a multidão, desceu as escadas e foi parar no refeitório, onde passou a ter vida farta, comendo os restos de comida do lixo, dormindo entre as panelas, e à noite, fugia pelo buraco do vidro quebrado e fazia fantásticas excursões pelas redondezas onde ficava um conjunto de apartamentos. Conheceu outros de sua espécie, mas jamais foi aceito totalmente pelos seus semelhantes, pois sua penugem branca dava-lhe ares aristocráticos, e ele era constantemente rejeitado pelos cinzentos do esgoto, que se sentiam enciumados por sua presença e sua bela figura para as fêmeas do convívio.