NO ÁPICE DO INFINITO
Eu procurava no infinito a sombra do que seria a outra parte de mim. Procurava, ao menos, um sentido consistente entre tantos sentidos vãos que a vida nos apregoa, durante as auroras diárias. Queria transcender a matéria, antes que a matéria me transcendesse e me devolvesse ao crepúsculo eterno da insignificância.
Prazer, eu sou Ninguém. Ando contando meus passos rumo à incerteza. Corro dos tiros das metralhadoras urbanas. Pego ônibus com medo de serem queimados ou dirijo por horas nos engarrafamentos de névoas. Trabalho detidamente por longas horas seguidas, obtendo um parco salário, na inversa proporção das necessidades de minha família. Pago impostos e taxas e contas repetidamente avassaladoras, em troca de péssimos serviços públicos e privados. Respeito as filas intermináveis dos bancos e das repartições, mas o mundo não me respeita; ele apenas mostra seus dentes de ouro sangrento e ri bem alto da minha invisibilidade. Nada disso basta. Eu sou Ninguém, neste estágio de civilização capitalista, eu sou Ninguém, como bilhões de outros seres humanos que sofrem apenas para que a minoria estúpida e, muitas vezes, corrupta, possa se esbanjar de materialismos efêmeros.
E como sempre me chamaram de pessimista ou de execrável idiota, por reclamar de basicamente tudo, resolvi que eu não seria mais fantoche nas mãos do destino; o destino é que me procurasse, e pedisse desculpas, ou fosse para o inferno, a fim de provar o ácido sabor da sua crueldade e da sua injustiça. Depois, entretanto, pensei: talvez nem sequer existisse destino... Quem inventou o verbo “existir” talvez já soubesse que ele não se aplicaria à maioria dos substantivos reais.
Vislumbrei, portanto, um lugar ao sol no ápice do infinito. E lá desenhei uma simples casa de sonhos, com tijolos de emoções sutis. Em seguida, mobiliei a casa apenas com algumas poucas cadeiras sobre as quais pudessem sentar-se as esperanças. Transformei minhas dúvidas em flores no jardim da casa, em meio às metamorfoses de estrelas em luas esquálidas. Também ergui paredes de paz entre os cômodos que os ventos varrem, sem gastar um centavo de qualquer moeda do mundo. Incrivelmente, no infinito, os fótons da essência valem muito mais que dinheiro. Pelo menos no ápice do infinito, não importa o que você tem, mas o que você é. Transmutei, assim, meus anseios em telhados contra as tempestades da avareza e a chama do amor passou a ser meu único chão.
Com o tempo, percebi que eu havia construído um sentido para a vida, bem no ápice do infinito, onde apenas a alma enxerga a vastidão de tudo. Um sonho me transportou até lá, enquanto eu procurava a sombra do que seria a outra parte de mim. A parte cujo nome é respeitado pelas estrelas. A parte que transcende a matéria e os números nas estatísticas populacionais. A parte sempre indivisível em cartões de crédito, em boletos bancários, em cheques pré-datados, em manchetes sangrentas de jornais redundantes; a parte, simplesmente, etérea e abstrata, valorizada por si só. Essa é a melhor parte do ser. E o infinito é apenas um dos labirintos da essência humana.
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"A esperança é o sonho do homem acordado."
Aristóteles
Observação: algumas pessoas perguntaram, mas o eu - lírico narrador do texto é um personagem, que não sou eu (risos). A narrativa em primeira pessoa foi apenas um recurso para enfatizar algumas ideias do texto. Agradeço a gentileza da leitura e comentário.
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Eu procurava no infinito a sombra do que seria a outra parte de mim. Procurava, ao menos, um sentido consistente entre tantos sentidos vãos que a vida nos apregoa, durante as auroras diárias. Queria transcender a matéria, antes que a matéria me transcendesse e me devolvesse ao crepúsculo eterno da insignificância.
Prazer, eu sou Ninguém. Ando contando meus passos rumo à incerteza. Corro dos tiros das metralhadoras urbanas. Pego ônibus com medo de serem queimados ou dirijo por horas nos engarrafamentos de névoas. Trabalho detidamente por longas horas seguidas, obtendo um parco salário, na inversa proporção das necessidades de minha família. Pago impostos e taxas e contas repetidamente avassaladoras, em troca de péssimos serviços públicos e privados. Respeito as filas intermináveis dos bancos e das repartições, mas o mundo não me respeita; ele apenas mostra seus dentes de ouro sangrento e ri bem alto da minha invisibilidade. Nada disso basta. Eu sou Ninguém, neste estágio de civilização capitalista, eu sou Ninguém, como bilhões de outros seres humanos que sofrem apenas para que a minoria estúpida e, muitas vezes, corrupta, possa se esbanjar de materialismos efêmeros.
E como sempre me chamaram de pessimista ou de execrável idiota, por reclamar de basicamente tudo, resolvi que eu não seria mais fantoche nas mãos do destino; o destino é que me procurasse, e pedisse desculpas, ou fosse para o inferno, a fim de provar o ácido sabor da sua crueldade e da sua injustiça. Depois, entretanto, pensei: talvez nem sequer existisse destino... Quem inventou o verbo “existir” talvez já soubesse que ele não se aplicaria à maioria dos substantivos reais.
Vislumbrei, portanto, um lugar ao sol no ápice do infinito. E lá desenhei uma simples casa de sonhos, com tijolos de emoções sutis. Em seguida, mobiliei a casa apenas com algumas poucas cadeiras sobre as quais pudessem sentar-se as esperanças. Transformei minhas dúvidas em flores no jardim da casa, em meio às metamorfoses de estrelas em luas esquálidas. Também ergui paredes de paz entre os cômodos que os ventos varrem, sem gastar um centavo de qualquer moeda do mundo. Incrivelmente, no infinito, os fótons da essência valem muito mais que dinheiro. Pelo menos no ápice do infinito, não importa o que você tem, mas o que você é. Transmutei, assim, meus anseios em telhados contra as tempestades da avareza e a chama do amor passou a ser meu único chão.
Com o tempo, percebi que eu havia construído um sentido para a vida, bem no ápice do infinito, onde apenas a alma enxerga a vastidão de tudo. Um sonho me transportou até lá, enquanto eu procurava a sombra do que seria a outra parte de mim. A parte cujo nome é respeitado pelas estrelas. A parte que transcende a matéria e os números nas estatísticas populacionais. A parte sempre indivisível em cartões de crédito, em boletos bancários, em cheques pré-datados, em manchetes sangrentas de jornais redundantes; a parte, simplesmente, etérea e abstrata, valorizada por si só. Essa é a melhor parte do ser. E o infinito é apenas um dos labirintos da essência humana.
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"A esperança é o sonho do homem acordado."
Aristóteles
Observação: algumas pessoas perguntaram, mas o eu - lírico narrador do texto é um personagem, que não sou eu (risos). A narrativa em primeira pessoa foi apenas um recurso para enfatizar algumas ideias do texto. Agradeço a gentileza da leitura e comentário.
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