Tem lembranças que nunca param de doer.
Já havia perdido a noção da hora. Nem importava se iriam reclamar de não ter avisado onde estava. Estava cansada. Só queria se distrair um pouco.Quem sabe sorrir? Talvez as duas doses de uísque ajudasse - pensou.
Algumas luzes do corredor haviam queimado, mas ainda sim conseguia ver sua maquiagem borrada no espelho da recepção. Seu corpo parecia leve, mas seus passos já não eram. Ela tentou não fazer barulho com o salto. Entrou no elevador e sentou um pouco para repousar suas pernas tremulas. Tem que ser muito forte. Lutar. Só que... vez em quando vem aquelas lembranças soltas. Sabe, já não tinha forças. Não mais. Ela realmente queria alguém ou algo que lhe fizesse sorrir. Sem ter que forçar. Sem ter que esconder as lágrimas que transbordavam [quase sempre]. Mas querer já não resolvia. E fugir também não.
A casa dormia ou quase, já que seu gato a observava. Aqueles olhos amarelos. Em seu quarto os papéis permaneciam espalhados pelo chão. Desejou com tanta força gritar. Tudo ali a sufocava. Os livros de romance e literatura, as fotos na parede ou mesmo no seu antigo diário, o cheiro no travesseiro, os filmes de amor e aquelas músicas. Tudo a sua volta. Precisava respirar. Debruçada na janela tentou lembrar de tudo que lhe fazia bem, mas elas também lhe traziam saudades [logo algumas lágrimas]. Já havia amanhecido. Sua mãe fazia o café. O pai reclamava que não encontrava a blusa que queria ou algo parecido. Sarah continuava na janela vendo a agitação da cidade e como queria não estar ali. Colocou algumas coisas que gostava na mochila. Tomou um gole de café com torradas. Comeu também alguns morangos[ ela adorava morango].Sua mãe a observava. Percebeu os olhos inchados e o lápis borrado nos olhos.
- Filha você esta bem?
- Sim... Não, mas vou ficar...vou ficar. Só preciso de uns dias, para que esgotem minhas lágrimas.
- Sabe. As vezes elas não cessam, filha. Tem lembranças que nunca param de doer, apenas vão perdendo a intensidade.