''' NAQUELA CIDADE.....

....ninguem morria de dia.

Nem acidentes de dia aconteciam, era difícil que isto acontecesse, acontecia sim acidentes de dia mas os coitados ou coitadas ficavam agonizando até que a noite alta estivesse.

Dona Maria Gorda, pesava ela mais de cento e cincoenta quilos a coitada, um dia logo cedo pela manhã foi ao banheiro fazer as duas coisas, xixi e cocô, o vaso sanitário primeiro pediu socorro, deu um estalo e trincou, ela ainda tentou levantar, não deu, tambem!!! pudera!!! com todo aquêle pêso como conseguiria? não levantou e foi caindo junto com os pedaços da louça afiada e nas suas gordas carnes entrando, foi aquela barulheira, gritos e correrias e sangue por todo lado e a coitada ao hospital foi levada, enxague, quase nem uma gota de sangue em seu corpo havia e ela, dona Maria, a gorda, não morria, de jeito nenhum e todos sabiam, de noite, diziam...de noite.

E o velho Gervásio que nos seus noventa e tantos entrava, diziam que era noventa e nove, que no próximo ano seria seu centenário, já fazia uma semana que ele com a ''sororoca'' estava e agora naquele pobre quarto de sua casa esperava a noite chegar...mais uma tinha se passado e ele ainda não tinha ido, ainda a ''coisa preta'' não tinha vindo busca-lo...que era ela, a coisa preta que nas noites vinha e levava aqueles que ela queria, quem não queria passava perto e nem olhava, seguia de largo..

E tudo isto começou muito tempo antes de hoje em dia, foi em uma noite em que o ''preiboizinho filhinho mimado do prefeito'' atropelou e matou a cigana Madalena e sua neta Filomena na frente do cigano marido e avô Ragho que tentavam atravesar a avenida naquela fria madrugada em que Madalena ia sendo levada para o pronto socorro pelo marido e pela neta e o cigano Ragho quando tudo se acabou e o filhinho mimado foi absolvido mesmo estando naquela hora do acidente bebado feito um ''gambá'' continuou rodando nas noites e madrugadas fazendo besteiras e aleijando e matando outras ''gentes...e o velho Ragho rogou uma praga....

"" A partir de hoje nesta cidade ninguem de dia morrerá, todos terão a mesma sina da minha velha e minha neta, sempre nas noites virando a madrugada, depois da meia noite é que a '' coisa preta'' virá buscar..e no primeiro raio de sol ela desaparecerá e depois desta hora todos teram que de novo esperar a noite chegar e ela, a coisa preta virá ''muntada'' em seu ''garanhão'' negro e ela com sua foice afiada vai um a um decapitando e suas cabeças levando e os corpos, o resto sem cabeça por aqui ficará..''

E assim foi a partir daquele dia seguinte em que esta praga foi rogada...o prefeito, pai do filhinho mimadinho, sofreu um acidente na estrada principal, seu carro bateu de frente em uma jamanta, isto era meio dia de um dia de sol a pino, foi levado agoniado e agonizante ao hospital, a cabeça quase decepeda e ele não morreu, morreu quando o relogio bateu a última badalada da meia noite, no atestado de óbito constava a hora da morte meia noite e um minuto e assim a praga pegou...o motorista da jamanta nada sofreu e quando o prefeito foi enterrado tinha a cabeça separada do corpo, tinham separado na hora da autopsia e quando tentavam colocar de novo não servia, havia inchado tanto que ficou apenas apoiada e o povo fofocando que com aqueles balanços todo do caixão onde será que a cabeça irá parar...nos pés, diziam os maldosos fofoqueiros.

E o povo da cidade se desesperou, alguns se mudaram, aqueles que podiam iam embora mas nem todos podiam e porisso ficavam e ficavam com medo desta nova situação e nem sabiam como isto enfrentarem, havia ajuda de pais de santos, médicos psicologos, cura da matriz e pastores de plantão dizendo que o mundo iria acabar logo mais

Mas a ''coisa preta de foice afiada na mão vinha montada no seu garanhão, negro como a noite e de longe se ouvia os cascos batendo nas ruas calçadas de pedras, saiam faíscas quando assim acontecia e o povo se escondia e quando na frente de alguma casa, na praça, no hospital, ela parava, corriam, não sabiam quem ela, a coisa preta, queria e naquele hospital viram quando ela no quarto de dona Maria Gorda entrava e quando ela saiu levava pela mão a coitada da dona Maria Gorda, sem cabeça diziam, sem cabeça juravam e quando a coitada foi enterrada ainda procuravam a cabeça....onde estaria? onde estava? nunca foi achada bem assim tambem a do velho Gervásio que tambem saiu acompanhado de sua casa dando as mãos para a coisa feia...foi tambem enterrado sem cabeça, credo em cruiz diziam as beatas e o cura rezava, os pastores protestavam que ainda o mundo iria acabar ja´ja´...

E ainda até hoje assim acontece naquela cidade ''pragueada'' pelo velho Ragho, o cigano gente boa que sem mulher e neta ficou mas que uma boa praga rogou e foi tão boa a conversa que ele, Ragho teve com a '' coisa pretra de foice na mão'' que ela mais um pedido dele naquela noite fatídica atendeu...

O '' filhinho preiboizinho mimadinho '' desenvolveu uma doença no estômago que nunca mais uma gota de alcool conseguiu nem nos lábios colocar, sofreu um acidente e não morreu, ficou todo torto e quebrado e nunca mais dirigiu carro nenhum e vai ficando velho, paralítico e todo doente, mas não morre, já tentou os pulsos cortar, não conseguiu e muito menos se enforcar e todo noite fica esperando a '' marvada , a mardita, coisa preta em frente do seu palacete passar, ela passa, pára, o garanhão bate os cascos adoidado, arranca fogo das pedras, a coisa preta mete a espora, o garanhão levanta nas patas dianteiras e com força bate nas pedras e segue em frente...e a coisa preta rindo e o filhinho maldizendo a coisa negra que segue em frente deixando-o de lado e ele se achando um coitado....coitado?

O povo da cidade não ''acha'' não ele um coitado, tem mais e´odio do danado...ódio mortal e não veem a hora que a coisa preta venha busca-lo, esperam que assim a ''praga'' seja retirada, esperam, esperam, esperam....vão esperando, uma espera que parece não ter fim...estão cansados de verem seus mortos serem levados apenas de noite...não e´natural, pensam, e não e´que não e´mesmo!!!

Morrer do viver faz parte, seja de dia , seja de noite

Afinal na hora de nascer não tem hora, se nasce de dia, se nasce de noite

E nem muito menos na hora da concepção, num é?

Naquela cidade isto foi ''quebrado, tirado do seu eixo natural '', um dia tudo isto volta ao normal, assim esperam todos que moram por lá, onde não se morre de dia, so´de noite...incrivel!!!

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WILLIAM ROBERTO CUNHA
Enviado por WILLIAM ROBERTO CUNHA em 27/07/2011
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