Até que a vida nos separe - Prólogo

Não é a vida que eu pedi a Deus. Trabalhar de enfermeiro neste hospital velho, cheirando a... Bem, cheirando a hospital. Viver sozinho, sem amigos, sem amores, na flor dos meus vinte e poucos anos (não, eu não lembro exatamente quantos anos tenho), tendo de meu somente algumas roupas e um quarto de pensão do centro da cidade. Típico jovem adulto, sem grandes expectativas e definitivamente sem sonhos de grandeza. Ah, e sem dinheiro também. Completamente.

Talvez eu nem consiga pagar o aluguel desse mês. Seria uma boa desculpa para aquela megera velha me despejar, e com um "simpático" sorriso, dizer enquanto delicadamente chuta minha bunda para fora de seu magnífico pardieiro imundo: "Desculpe, meu filho, mas entenda que eu tenho que me manter, e preciso de gente que pague de verdade o aluguel, em dia. Não é nada pessoal". Nada pessoal... Bem, talvez não seja tão mal. Provavelmente aquela choça úmida vai desabar num futuro próximo, e eu acabaria agradecendo a ela por me chutar de lá, se não estivesse ocupado demais rolando no chão de tanto rir.

Mais e mais, o tédio me consome. São poucas as minhas fontes de contentamento. O barzinho da sexta, por exemplo, com aquele estupendo fundo musical à la Mark Knopfler, e as sucessivas doses de Jack Daniels falsificado, conseguem me distrair um pouco. Meu violão, já bem surrado, mais melodioso como nunca, é minha maior fonte de alegria. Se eu fosse me casar hoje, minha noiva provavelmente seria aquele Epiphone Texan que eu tanto amo, embora eu dispensasse véu e grinalda. E que lua de mel não seria... Eu dedilhando minha noiva, e a voz dela seria linda, linda... Cantando sons, seus rés, fás e mis menores... Pena que ainda não é o suficiente.

Não tenho nenhum orgulho em admitir, mas meu nível de ânimo sempre esteve ligado à concentração etílica no meu sangue. A bebida, para mim, age como um antidepressivo. E como estou ficando numa situação financeira no mínimo complicada, meu antidepressivo está ficando cada vez mais distante. Por isso é tão difícil não estar depressivo.

Acho que já deu pra perceber que eu sou um cara bem reclamão. Às vezes me pego sorrindo, imaginando o velho ranzinza que vou me tornar, se por acaso conseguir sobreviver até lá.

Bem, bem, bem, mas chega disso. Hoje é um novo dia, quem sabe as coisas não melhoram para mim? Até por que piorar tá bem difícil...

(Ah, eu não sabia o quão errado eu estava em pensar assim...).

FIM DO PRÓLOGO

Jhonata Luís
Enviado por Jhonata Luís em 20/06/2011
Código do texto: T3046048
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.