Quinino

Eu quase me derretia na cama. A noite estava apenas começando e pelo visto as alucinações também. Enquanto o calor fritava meu cérebro, o quarto vazio começou a ficar escuro. Uma luz surgiu: nasceu amarela e tornou-se vermelha. Continuou a mudar. Quis me levantar. O fiz com uma força sobrehumana, já que a malária havia me sugado a vitalidade de aventureiro que jurei trazer para a selva.

Ouvi sons metálicos ao longe. Poderia ser o doutor ou os enfermeiros chegando. As paredes começaram a se dilatar em sombras, duma delas brotou Celeste. Ela estava linda. A luz azul sobre o seu rosto apenas a deixava mais jovem. E ela se aproximava de mim, enquanto o mundo todo parecia liquifazer. Ela me perguntava, me perguntava "por quê? Por quê?" Celeste nunca aceitou bem o fim de nosso noivado. Seus olhos começaram a se tornar fundos e seu rosto angelical transformou-se na cara de um monstro terrível de dentes enormes e olhar insano. Me assustei. Cai do outro lado da cama. O monstro me perseguia. Eu me esquivava, mas sem equilíbrio. Não vi outra escapatória: me atirei da janela. No instante em que o vidro se partiu em milhares de cacos tudo ficou lento e pude ver tudo o que tinha feito até agora. Os cacos desacelaram e eu me esborrachei no chão. Morri e estava agora num local branco,todo embaçado. Não sei se é realmente o Céu. Enxerguei uma silhueta, minha visão estava embaçada e não pude reconhecê-la. Sei que estava de branco. Ela se aproximou e outras criaturas surgiram, do mesmo tipo. Eu não podia me mover, o que podia fazer era apenas esperar que elas se aproximassem de mim. E se aproximaram. Uma delas, enquanto a primeira me examinava, disse: "Doutor, o tratamento com quinino está dando certo!"