O CICLO CRÍTICO
O CICLO CRÍTICO
No começo de tudo, antes até do Big Bang, eu sei por que estava lá; a vida não tinha oxigênio para se desenvolver, mas se desenvolveu. Os materiais inorgânicos nem oxidavam. Não sei quem, acho que foi o cara da manutenção, meteu oxigênio na coisa. Não deu outra: surgiram as bactérias, os vírus, os vermes e outros trouxas.
Não sei se vocês sabem, mas o sol não brilha só para (algas) alguns; também brilha para estes bichinhos citados acima. Em função disto qualquer dia destes estaremos matando bactérias a tiros. Sabe por quê? Por que a vida é uma loteria, para não dizer roleta russa; e, assim cada um segue com seu azar particular.
Não posso prometer um mar de rosas, tão pouco um tapete de espinhos; ainda que tudo seja semelhante a uma colcha de retalhos; onde um pedaço sim, salta um, o outro também, são dispostos conforme a lógica da coincidência, sem interferência da violenta realidade. Pior. Nada neste contexto é por acaso, há causas e efeitos, mesmo além do resumo do resumo.
Voltando as bactérias; fiz amizade com uma, muito legal. Conheci-a por acaso. Eu estava com uma úlcera péptica daquelas. E sem mais nem por que comecei a dar vômitos horrorosos; e, num deste saiu uma gosma esverdeada; e, nesta eis minha nova amiga. Não, lá não estava só ela, haviam milhares de outras, mas só fiz amizade com: PROCARIOTA. Nome diferente, mas bonito.
Nossa amizade começou pelo fato de uma curiosidade momentânea que tive. Não sou curioso. Mas dizem que o que tem que acontecer acaba acontecendo. Assim aconteceu.
Ao ver aquela gosma esparramada nas paredes da pia (lavabo para alguns). Se não sabem fiquem sabendo: gosma é quase uma cola, não escorre facilmente; por isto ficou ali grudada na pia. Pois bem, vendo aquela verdura resolvi movimentá-la. Mexi com o cabo da escova de dentes, para fazê-la descer. E nesta ação trouxe no cabo da escova minha amiga.
Ao subir a escova para uma observação mais apurada daquela substância que veio do meu interior, ouvi o primeiro berro:
- Me larga! Me deixa onde estava!
De imediato não atinei para o que ou quem poderia estar sendo tão escandaloso. A princípio pensei que fossem os moleques lá na rua. Mas no segundo grito:
- Seu filho da puta! Me devolva para junto das minhas amigas!
Percebi que aquela gritaria vinha da extremidade do cabo da escova.
E sem susto ou repulsa perguntei:
- Quem esta fazendo este escândalo?
- Não vê que sou eu!
- Eu quem?
- Procariota.
Foi aí que percebi de onde vinha o som, mas não via nada. Até por que vocês sabem: bactéria é visível só com microscópio.
- Mas quem é você Procariota?
Ela, agora mais calma, respondeu:
- Sou uma bactéria de alta estirpe que estava na sua úlcera.
Sou coração de manteiga derretida. Fiquei com pena da bichinha. Agora sozinha. Resolvi a questão. Lambi o cabo da escova devolvendo Procariota ao seu lar.
E o ciclo se repetirá indefinidamente.
(março/2011)