A CACHAÇA INFIEL
A CACHAÇA INFIEL
Amizades são constituídas a partir dos objetivos comuns, lugares comuns; mesmos desejos e respeito às opiniões diversas. Lauro é amigo fiel. Aos domingos, feriados, festas de fim de ano, ele nunca dispensa seus amigos: Albano e a cachaça.
- Vamos? – é o convite sempre feito pela retórica da palavra. Albano aceita, como de costume, com gestos, ações, prontificações.
O boteco da rua 46 é o ponto cativo.
Piadas, risos, conversa inútil e, claro, a cachaça são algumas das motivações dos furtivos encontros. Motivações do fiel amigo, do amigo fiel.
Albano, capcioso, sempre anuncia que, nessas saídas, sustenta uma relação extra-conjugal e é plenamente apoiado pela cumplicidade do amigo fiel, porém a cachaça não permite revelar tamanha ingenuidade.
Mediante a cobertura moral do amigo, Albano se despede da rua 46 e transita a cidade entre lugares comuns – casa do amigo que lhe aguarda ansioso no bar - e incomuns (longe dos olhos de Lauro); sagrados e profanos; Albano prova do amor compartilhado e a volúpia da natureza masculina dilacera, desperta-se em sensações pitorescas, irreverentes e naturais, deleita-se em prazeres propícios do incerto, grotescos e cruéis por manchar a flor da amizade.
Saciado, retorna para a companhia do amigo. Albano evidencia a coragem de ludibriar e ferir o amigo, demonstra a face camuflada, sorriso escanteado.
Para Lauro, com seu olhar cheio de escamas, só a cachaça é infiel.