OS FILHOS DA NETE

 

NETE casou muito cedo e teve OITO filhos. Poucos deram pra gente, como se diz no meu nordeste, talvez por conta de que ela era um poco "PÃE" daquela numerosa prole. Contudo, embora não podendo criá-los como gostaria, na medida do possível encaminhou aqueles que queriam vencer na vida. Os que não quiseram estudar, a NETE logo os deixou de mão em prol dos demais.

Como a maioria dos maridos machistas, o de Nete, Oswaldo Spanovitch não fugia da regra. Descendente de estrangeiro, entendia que mulher sua tinha que ser pra cama e mesa e nas horas vagas, banho. Nenhum bom projeto de vida de Nete dava certo se ela contasse, primeiro, ao marido. Ele sentia prazer em se meter e destruir os sonhos da esposa. Quando não fazia isto cara a cara, nas caladas da noite acionava seus “botões” e mandava as aspirações de Nete para a lixeira. Até aconselhada foi para procurar um pai de santo para que ela ficasse protegida, uma espécie de antivirus.

O filho mais velho dela, Escanervaldo nem bem terminou os estudos e engravidou uma mulher que deu a luz a gêmeos. Depois correu a notícia de que outra mulher teria sido por ele engravidada. Dois outros filhos de Nete, o Niltrojan e Tróiantonio foram ganhar a vida em São Paulo. Ficaram por lá sem mais dar notícias de vida ou de morte. Mais outro filho dela, o segundo mais velho, o Deletício, quis ser padre e entrou para estudar como seminarista num convento franciscano na capital de Alagoas. Das quatro filhas mulheres (é assim que se diz por aqui), quis o destino dar a NETE grande prova da sua força e ironia: a mais nova, Viruscia, conseguiu terminar o ensino médio, mas logo se apaixonou por uma mulher. O caso dela virou uma doença, mais parecia um vírus que ela fazia questão que alcançasse todas as amigas, ignorando todo o seu passado de orgia e lascívia com os homens; Ledinilda, a mais velha, só se interessava por viver de festa – vestia-se com roupa de grife porque ser fina era seu ideal. Sempre fazia questão de mostrar um livro de Danuza Leão, sobre etiquetas. Mas fineza mesmo, Ledinilda não tinha e, se não bastasse tudo isto, fazia questão de ser convidada para festas socialites, mas sem sucesso. A última vez que entrou de penetra numa festa, saiu na bordoada quando foi descoberta colocando um cinzeiro de cristal na bolsa. Realizava-se quando os homens a achavam bonita e as mulheres chamavam-na oferecida, porque ela teria oportunidade de sair por “cima”, de fininho, como se costuma dizer.

Contudo, duas dessas filhas (as do meio) seguiram o ritual normal de moças pobres, mas limpinhas: Linknilda e Beckapinalda! Linknilda não queria saber de estudo. Trocava a noite pelo dia na internet.  Seu negócio era fazer fofoca, fuxico, jogar uns contra os outros, principalmente nas redes de relacionamentos sociais. Sua grande arma era se envolver em outras histórias e meter outras pessoas nas suas e, no final, dizer que aquilo que disseram que ela disse era mentira de quem contou. Contar uma coisa a ela sobre outra pessoa era ter a certeza de que no outro dia tudo estava publicado em rede. Adorava "fazer a ponte" entre namorados que haviam se separado, mas depois de juntos, ela mesma se encarregava de descarregar o romance em proveito próprio. Por outro lado,  Beckapinalda era a mais caprichosa. Responsável, ela não desperdiçava nada, nem jogava nada fora. Tinha verdadeira mania de reciclar, de customizar tudo que via e que pegava. Por conta dessa mania, a coitada não parava com um namorado por muito tempo, pois todos ficavam com medo dela, como se ela fosse uma caixinha de segredos da vida de todos que lhe cercassem. Outra sua grande mania era de fotografar. Viu beckapinalda, lembrava logo da câmera fotográfica. O pior é que ninguém conseguia ver as fotos que tirava, pois elas iam para um grande baú de quinquilharias que ela mantinha conservado no seu quarto. Em casa, quando Nete pensava que tinha jogado alguma coisa fora, logo ela ia na “lixeira” particular e devolvia a mãe.

Diante desses perfis, Nete sempre se questionava: “onde foi que eu errei?” – mais parecia alguns pais quando vão às delegacias soltarem os filhos homófobos, xenófobos, ou assassinos do trânsito. Triste com seu fracasso como mãe, pois era assim que ela se sentia, procurou ajuda de um líder espiritual. Escolheu um padre que foi recomendado por uma rede de relacionamento social. Durante a confissão, o padre Deletício disse que ela nada tinha que se culpar; que apagasse aquilo tudo e botasse na lixeira. Passasse uma borracha no passado e recomeçasse nova vida com outro marido e, se a idade permitisse, tivesse mais filhos.

Nete saiu pior do que entrou. Contou o episódio a uma grande amiga e esta lhe confidenciou que seu filho, o Deletício tinha sido preso envolvido em pedofilia numa igreja católica lá no interior das alagoas, precisamente em Arapiraca. Pra Nete não foi difícil fazer o Link que aquele padre era seu filho, mas que ela continuou ignorando diante dos fatos ocorridos. Como se não bastasse, uma coisa encafifava a Nete: o paradeiro de seus outros dois filhos que foram para São Paulo! Ligou para uma irmã sua em Campinas,  que logo fez um relato deles: Niltrojan estava milionário. Mas vivia fugindo da polícia, porque era especialista em criar vírus para entrar nos computadores pela internet rastreando senhas de banco. Trabalhava para um grupo de falsários vindos da China e do Canadá, mas que perdera o contato com ele. Por outro lado o Tróiantonio vivia no Brasil fazendo gambiarras de internet via rádio nas comunidades pobres do Rio e de São Paulo. Tinha como aliados os traficantes de drogas, principalmente do conjunto de favelas do Alemão no Rio. Este meu sobrinho vez por outra ainda me liga para dizer que tá vivo, disse a irmã de Nete. Completou INFORMANDO que sempre que o cerco aperta, ele muda de nome, entra em nova "rede" e DANIFICA os equipamentos para depois cobrar pelo conserto. Isto enquanto o cerco da polícia não sai da sua área. Porque ele volta a danificar os equipamentos para novamente fazer manutenção para depois poder danificá-los.

Nete, finalmente, abandonada convicta, tenta ver se não se deixa levar pela violência da solidão destes tempos de tanta modernidade. Linknilda e Beckapnalda, já meio rechaçadas pela idade, decidiram trabalhar para ajudar na manutenção da casa. Mas “desde que não abandonem suas principais aptidões”, refutaram. De repente, adentra na porta principal da casa o Sr. Oswaldo Spanovitch! Nete quase desmaiou, mas logo as filhas trouxeram água com açúcar e um diálogo difícil  foi tentado sem muito sucesso. Mas ele não queria voltar para Nete, disse. Sua ida àquela casa era para deixar aquele filho – um garotinho de mais ou menos 10 anos que Oswaldo tivera fora do casamento e que sua mãe, há pouco tempo morrera atropelada. Nete que se imaginava até viúva, agora se depara com mais um filho, mesmo que postiço para criar. Perguntou o nome do garoto ao que este respondeu: Netvânio da Silva Beckapitulino Spanovitch da Virtualidade. Nete desmaiou, foi internada, mas não morreu. Quem souber notícias dela, faça o favor de não me avisar.