Constelação de Perséfone
Aos leitores avulsos e acompanhantes:
Esse conto foi objeto de publicação em livro correspondente às obras expostas à comissão de literatura do YAMIX III (promovido pela Universidade Estadual de Roraima).
Agradeço o apoio de todos os que contribuem para meus -sempre- aperfeiçoamentos.
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Era uma vez... uma galáxia. A galáxia negra. E a esta uma constelação - a constelação de perséfone.
A tal constelação surge dos delírios mentais de Perséfone. Jovem donzela, raptada por Hades - senhor dos mortos -, que a fez conhecer um reino subterrâneo e à semente de romã, a qual ataria seus pés ali por 1/3 de ano.
Durante esse período, Perséfone emerge um desejo: criar uma constelação que regesse a humanidade, de forma que, à cada um fosse atribuída valor genuíno. Assim, pensava Perséfone acabar com a dependência que soava, unissonamente, à existência de resultados provenientes de quaisquer necessidades. Os deuses gregos, mitologicamente, vinculavam atividades entre si, dividindo-as, cada um tinha uma típica a realizar, inexistindo substituições, até mesmo pela imortalidade dos deuses. Perséfone portanto, desejava a mortalidade, visando conhecer um mundo espiritual narrado pela serpente no jardim da Babilônia. Acreditando que os regentes poderiam suprir tal dependência a semideusa deu seguimento a seus planos. Estava pensando em si, agora.
Em exatos 30 dias à "prisão" subterrânea, estabelece na galáxia, aridez. O período de seca, representa a criação das personagens da constelação, elas não possuem características congruentes e determinadas. Assim, entre os intervalos de uma criação e outra, estas se comunicavam mutuamente, buscando lograr completude. Perséfone ainda estava descontente.
Aos 15 dias subsequentes, criou personificações e as atribuiu a cada uma, ali.
E na constelação soaram doze guias.
Perséfone se agradou do que construiu e observou sua criação pelos 75 dias que lhe sobraram no cárcere.
Cada umas das geradas buscaram locupletar-se, todavia, algumas, frustradamente. Isto porque, Perséfone atribuiu àquelas mesmas personificações. A Tonúbis, água e impaciência; a Remonís o poder da lua: iluminar, encantar e também a solene presença da água; à Plênia doçura extrema e sapiência, e assim por diante até que se confinasse às doze estrelas qualidades distintivas. De modo que, Plênia locupletava-se a Tonúbis pela doçura atrelada à impaciência, todavia, a união deste com Remonís não lograria êxito, por serem água.
Logicamente, água precisa de limites, por ser intangível quanto à sua liquidez. O fogo seria um atalho sábio à contenção de uma torrente, não? E de inversa maneira, também haveria lucro.
Foi então que, Atnamás, sagazmente não provocou, a nenhum dos presentes, combinação qualquer, antes estudaria todos ali.
O nobre observador já observava a oitava estrela, e até ali só atestou infringências mútuas, bestiais. E já desanimado, por não encontrar qualquer daquelas que - pela sua lógica - fosse capaz de embater-lhe completude, depara-se com uma estrela quieta, de olhar fixo e corajoso, parecendo conter em si toda a verdade daquela galáxia e ainda a da terrena (a qual pertencia Perséfone). Tinha uma dupla natureza, todavia não aparentava ares de monstruosidade. E ainda, aquela quieta estrela parecia arredia à idéia de completar-se a outro dali, isso chamou a atenção de Atnamás.
Porém, muito cauteloso, esperou. Estudou a nona estrela, astuciosamente. Sempre observando-o, perceptivamente, contudo Ahánat {era assim que se chamava}, despreocupadamente, dava nota de tudo e portanto, ignorava-o.
Atnamás, tenta, das formas discretas chamar atenção de Ahánat, mas nada parece a pertubar, enquanto Atnamás parece cada vez mais atraído. É o poder conferido à Ahánat, o poder do magnetismo, além do fogo, da alegria, do otimismo, da liberdade...
Ahánat, sapiente, aproxima-se do companheiro e dirigi-lhes palavras de paz, em profundo olhar ao rosto. Percebe orgulho, robustez... quebrantada pela intensidade com que corre a curiosidade sobre sua intrigante e certa despreocupação e - ainda que precoce - pelo iminente desejo de atrelar-se a ele. Atnamás, ainda não conhecia as personificações aferidas à Ahánat também zelava pela ignorância do companheiro à ausência desta.
Enfim, percebem-se convergências mútuas quanto às características de ambos.
O olhar lançado a Atnamás foi fiel, sincero, peculiar, diferente, indiferente às expectativas dele. Ocorreram só as palavras e o olhar, a despedida foi o queixo em sinal de respeito ao espaço do alheio e a saída rápida. Atnamás perturbou-se, pois o olhar de todos os demais transmitia-lhe tão somente desejo bestial de sobrevivência.
Ocorreu, então, que Perséfone desejou acirrar ou até mesmo mudar o percurso que seguia àquela trama. Anunciou entre eles um sorteio de pares, e a partir da consumação deste os pares deveriam unir-se: quer por vontade, quer por sorte.
Atnamás e Ahánat formaram um par. Perceberam qual já eminente era o elo que os unia um a um, minuciosamente. Apaixonaram-se, todavia Ahánat, libertina, não encontrava outro meio de assegurar-lhe o sentimento que lhe ocultava. De igual modo Atnamás, porém, este o suprimia não por desejo de liberdade, mas tão somente pela incerteza do que insurgia entre ambos.
Cruzou-se como a água e o fogo: a liberdade e a incerteza.
Assim, não se locupletavam, sentiam-se locupletados. E não era tudo.
Lançou-se o mistério à mente de Perséfone: "Terá eu criado dentre doze estrelas, duas que destinariam-se uma a outra? E se de fato procede isto, de que adiantará minhas criações, se estes - dependendo dessa união e por completarem-se - podem assumir a nomeação de deuses e a qualidade de imortais, e portanto regredir meus ensejos e desfazer-se meus planos? Voltarei eu do mundo em que se conhece o bem e o mal praticando-o sem prejuízos além do que admoestações? Voltarei eu do paraíso real? Há sorte na união de Atnamás e Ahánat, ou intervenção divina? Se sim, que deus faria isso?
Perséfone volta a Elêusis sem nada ter solucionado. Os deuses tornam-se mortais pelo pecado da soberba de Perséfone. No controle encontra-se o rei dos reis, senhor dos senhores, único e digno de louvor por ser o real criador de tudo e de todos e não Atnamás e Ahánat ou ambos como previu erroneamente - in dubio - Perséfone.
O tempestivo tormento da paixão que envolvia Atnamás e Ahánat ocasiona a sua locupletação. A água e o fogo, a liberdade e a incerteza amam-se por uma noite inteira, sem intervalos, de tamanho combustível a água não apaga o fogo e nem o fogo torna a água em gás, a liberdade se prende à incerteza de nunca saber quando se libertará dela. Atnamás e Ahánat têm seus gozos corpóreos, espirituais, tomados em dimensão intangível.
Seguem regentes e amantes e apaixonados, todavia, não há consentimento divino à cerca desta simbiose afetiva, materializada. Então, na galáxia negra eles seguem locupletando-se, vigorosamente, luxuriosamente, astuciosamente, orgulhosamente, perdidamente... Tamanha a paixão - idem à interferência que exerce entre os seus regidos - que estes auferiram o que chamamos aqui de amor. Mas... isso é uma outra história.
Era uma vez...