O Homem que Destruía Urnas

No inicío estava só, mas depois eram uma legião.

A ideia surgiu de uma brincadeira, mas logo lhe tomou de assalto e se tornou necessidade latente, quase primitiva e, de certa forma, era.

Quando fez pela primeira vez a midía reprovou e a sociedade ficou em choque.

Mas depois aplaudiram.

Depois grafitaram seu nome na parede, muito depois de tudo ter acabado.

A coisa tomou proporções colossais.

No primeiro dia, depois de matutar a ideia, levantou, pegou o martelo e saiu depois de tomar um café.

Pesquisou o dia todo até descobrir onde eles guardavam as urnas.

Quando chegou lá, acertou o martelo na cabeça de um dos seguranças e entrou no galpão.

Passou a noite lá, não saiu enquanto as urnas não tinham virado sucata.

Voltou para casa e foi dormir.

No outro dia, todos os jonais na televisão ou impressos berravam "Homem destrói urnas eleitorais da 4ª região!", ou, "Eleição adiada por ato terrorista".

As pessoas ficaram perplexas, mas esse mesmo homem se chocou quando ligou a televisão poucos dias depois e viu:

"Num ato terrorista generalizado, galpões que guardavam as urnas eleitorais da eleição deste ano foram incendiados em vários dos grandes pólos urbanos do país, destruindo cerca de 75% das urnas do Brasil. Devido a este atentado as eleições para presidencia estão adiadas até segundo aviso. Boa noite"

Logo a policía começou a investigar.

Quando é politíca tudo é muito rápido.

Em menos de cinco dias eles chegam a José Ferreira, o homem do martelo.

Eles algemam José e o arrastam para fora, lá centenas de repórteres e flashs, câmeras e microfones e gravadores e todos perguntam "Porque você fez isso?"

José Ferreira tenta responder, mas um policial bate com o cacetete em suas costelas e ele se cala. O forçam a entrar no carro, empurram ele lá para dentro e saem disparado.

A imprensa passa mais de um mês noticiando as novidades do caso. Brotam advogados dativos brigando para defender José, mas ele recusa todos, então o juiz nomeia um defensor público.

No dia do julgamento uma multidão se amontoa na frente do tribunal, placas dizem "Ele fez o que todos nós queriamos", e, "Soltem José. Ele é o povo"

Quando a policía traz José Ferreira para depor, todos gritam que tenha força, que estão com ele. Que o povo está junto com ele.

Alguns jornalistas de grandes emissoras e jornais conseguem entrar, a sala de julgamento está ruidosa. O juiz aperta o botão de silêncio que rui e grita "Silêncio"

Aí prossegue toda a formalidade e burocracia. Uma hora se passa.

Começam a questionar José Ferreira.

O promotor diz "Por que você fez isso?"

"Porque eu queria que mudasse..."

"Que o que mudasse?", diz o promotor com seu tom nobre.

"Tudo isso", José diz abrindo os braços ao seu redor.

"Você é um anarquista, senhor José?"

"Não", responde José, "apenas um homem comum"

"Somos todos homens comuns aqui, senhor Ferreira"

"Não. Vocês não são como eu, e o resto do povo que está lá fora"

"Por que?"

"Porque nós trabalhamos para vocês, mas quem recebe são vocês"

"Ora, que ultraje, isso é desacato a autoridade!"

"E o seu abuso de poder?"

"Silêncio", diz o juiz perante o burburinho que se levanta.

"Quer saber porque eu fiz?", diz José, "Vou te dizer, eu quebrei as urnas porque nenhum filho da puta deveria ter o direito de governar nosso belo país..."

"O que você..."

"Ordem! Senhor Ferreira, se continuar deverei encerrar a sessão jurisdicional"

"Nenhum homem deveria trabalhar para o Estado, deveria ser exatamente o contrário", José diz vendo os policiais se aproximarem, o juiz está mandando segurá-lo, tirá-lo dali. "Não são vocês que deveriam ganhar quarenta vezes o salário minímo, mas aqueles que catam o lixo de vocês, e limpam a merda que vocês jogam no chão todos os dias na rua. Aqueles que constroem as mansões que vocês vivem e plantam a comida que vocês comem debaixo de quarenta graus de sol..."

Os policiais arrastam José para fora do Tribunal, ele vê algumas das urnas destruídas que o promotor usava como prova do crime e diz "Vejam! está é a urna funerária na qual depositamos as cinzas do corpo morto da democracia"

"Isso é um ultraje contra o Estado de Direito", berra o promotor, quase babando.

"Do seu Estado de Direito"

"Esperem", diz o juiz, "Senhor Ferreira, vou lhe dar uma segunda chance, o que diz em sua defesa, porque fez isso?"

"Mas, se ergues da Justiça a clava forte, Verás que um filho teu não foge à luta, Nem teme, quem te adora, à própria morte..."

"Basta", sentencia o juiz, "Tirem-no daqui".

Gabriel Dominato
Enviado por Gabriel Dominato em 26/10/2010
Reeditado em 26/10/2010
Código do texto: T2578958
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