MEUS DOIS VIZINHOS E EU...

Vizinho 1 e eu:

Nós nos gostamos. Não confiamos um no outro, mas ainda assim, estranhamente, nós nos gostamos. Dou um jeito de estabelecer com ele alguns pontos de tangência. Peço emprestado revistas de decoração; sei que ele adora que eu as peça. Ele tem alma e corpo de mulher. A alma é irrefutavelmente feminina; o corpo também, mas este somente ele reconhece em reflexos plenos e secretos.

Ele me instiga. Pergunta-me sobre meus vizinhos de parede. Conto-lhe quase tudo. Ele que reparta sua solidão com a curiosidade do que revelarei depois... ou não. O alvo de tanta avidez vem de meu vizinho de parede, meu vizinho 2, um ogro tatuado, torturado de paixão nua e crua. De minha parede vazam sons guturais de pavor e de paixão, sempre precedidos de um silêncio profano. Casal à beira de uma tragédia. Bato na madeira, três vezes. Que continuem assim - que Deus me perdoe, mas ouvinte que sou dessa metamorfose carnal que alterna golpes de foice com sussuros inaudíveis deste lado em que estou, fazem de mim detentora de segredos de alcova. Conto quase tudo pra ele, meu vizinho 1, mas deixo detalhes cuidadosamente camuflados, para serem revelados depois... Assim, estabeleço novos pontos de tangência. Ele pensa que me usa, mas eu, despudoradamente é que faço uso dele, personagem adotado por mim à espera de um novo capítulo. Assim é essa nossa estranha amizade...

Belinda Tiengo
Enviado por Belinda Tiengo em 07/10/2010
Código do texto: T2543853
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