O Temporizador Alucinado
Já fazia algum tempo que eu não via esse meu amigo, foi quando o encontrei na rua, de fronte a um boteco. Tínhamos a mesma idade, e estudamos juntos por vários anos, isso até terminarmos o ensino médio, aí ele foi pra faculdade de engenharia e eu segui outra profissão.
Ele não representava nem sombra do que fora no passado, estava mais acabado do que nunca, parecia uma outra pessoa. No colégio, sempre andava rodeado de meninas e colegas pomposos. Independente da beleza e do poder aquisitivo que ostentava, o cara era bacana, simpático, tratava a todos com igualdade, acho que por isso, é que não lhe faltavam amigos.
Só sei dizer que, o cara me convidou pra tomar uma cerveja, pra lembrarmos dos velhos tempos. Já no balcão do bar o cara puxou um palmtop, enquanto nós tomávamos aquela gelada, ele digitava freneticamente o aparelho.
Ele conversava comigo, enquanto mexia naquela porcaria, já estava me dando nos nervos! Curioso que sou perguntei, que tanto ele mexia naquele aparelho?
Foi quando ele me falou, de uma teoria a respeito do aproveitamento minucioso do tempo. Mostrou-me uns cálculos aritméticos, que a princípio não entendi direito.
Com muita paciência, ele começou a demonstrar sua teoria, eram várias espécies de cálculos. Ele fracionava o ano em dias, depois os dias em horas e, em seguida as horas do dia em minutos.
Pelo que eu entendi era assim: 1 dia tem 24hs, logo um mês (30 dias) teria 720hs, um ano que não fosse bissexto, portanto 365 dias, teriam 8760hs. Até aí conversa estava fluindo muito simples, apesar dele ser engenheiro físico, esses cálculos aritméticos eram simples com deduções lógicas.
O problema maior foi quando, ele começou a querer me convencer que, as pessoas estavam perdendo momentos preciosos das suas vidas na cama, e que, ele se recusava a aceitar a lógica temporal da realidade dos fatos.
Segundo meu amigo, nós perdíamos 1/3 de nossas vidas na cama, ou seja, os dorminhocos que passavam 8hs descansando o esqueleto, em um mês haviam perdido 10 dias de suas preciosas vidas.
Neste raciocínio, já da pra ver, que uma pessoa com 90 anos, que sempre foi boa de cama (no sentido literal) perdeu 30 anos da sua vida.
Perguntou-me quanto eu costumava dormir, ao mesmo tempo em que me informou que ele, estava dormindo apenas 4hs por dia, pois acreditava que estaria ganhando 120hs por mês. Sendo assim, era só fazer o cálculo inverso, ao invés de perder ele estaria ganhando horas vidas.
Tentei argumentar com ele da importância do sono, mas foi inútil, ele permanecia inacessível e resignado em suas convicções.
Disse-me que, já adotara essa insólita teoria temporal, já algum tempo, e segundo seus cálculos sua idade já não era mais aquela dos documentos, pois já haviam se passado 5 anos, em que resolveu abrir mão de suas 8hs de sono diária.
Levantou, despediu-se de mim com um abraço, falou que seu tempo era curto e que, estava atrasado para um compromisso, puxou da carteira uma nota de dez, colocou sobre o balcão do bar, quis segura-lo por mais alguns instantes, dizendo para esperar pelo troco. Não teve jeito, com a mesma rapidez que nos encontramos, ele saiu.
Peguei o troco e sai gritando seu nome, inútil, a calçada estava cheia de gente, e ele já se misturara em meio aos transeuntes.
Estava com algumas contas a serem pagas no bolso, tinham que serem pagas hoje, senão teriam juros e multas. No caminho comecei a pensar, como estamos amarrados ao tempo, e essa teoria de aproveitamento do tempo deste meu amigo!
Que coisa...o cara disse que já fazem 5 anos que ele dorme 4hs por dia. Deixe-me ver...seriam 4hs, vezes 7 dias da semana que, dariam 28hs, logo ele ganharia um pouco mais 1 dia por semana, o mês tem 4 semanas por tanto, mais ou menos 5 dias por mês, 1 ano têm 12 meses, então.........