Hotel Granada
Todos jantavam em respeitoso silêncio.
Os homens de terno e gravata e a mulheres com vestidos longos, até pareciam que estavam em uma festa de gala. O Hotel era de luxo e considerado o melhor da aprazível estação de águas da cidade de São Lourenço, no Estado de Minas Gerais. A década era de 50, do século passado. O Hotel oferecia café da manhã, almoço, lanche por volta das 15,00h e jantar. Tudo isso! Outros tempos! Outros Carnavais!
Os executivos, intelectuais, trabalhadores em geral, recebiam orientação de seus médicos para passarem, uma vez por ano, as férias em uma estação de águas, por no mínimo 21 dias. Era a receita da época para evitar a estafa.
A atração principal era o Parque das Águas e a criançada aproveitava para beber todo tipo de água mineral. Quando não estavam no Parque, remando nos barquinhos do lago, estavam galopando em algum cavalo ou burrico pela cidade inteira. No Hotel, os mais velhos se divertiam com os jogos de cartas, sinuca e ping-pong. Organizavam-se torneios entre os hóspedes de vários hotéis, tanto para o jogo de cartas, como para o jogo de ping-pong.
Até desfile de modas se organizava. À noite, no salão nobre do Hotel, famílias inteiras se juntavam para conversar e também para cantar. Era a época dos boleros, das músicas cubanas e guarânias paraguaias, sem falar nas marchinhas de carnaval. As músicas “Índia”, “Granada” e “La Cumparsita” eram as mais tocadas e cantadas. Muitos namoros entre rapazes e moças se iniciavam neste propício ambiente.
Com o passar do tempo, as famílias acabavam retornando para suas cidades de origem: Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, entre outras. Havia um ritual muito bonito e que arrancava lágrimas do pessoal. Era quando as pessoas partiam do Hotel. As que ainda ficavam, já saudosas, começavam a cantar “Está chegando a hora ". E todo mundo cantava: “Quem parte leva saudades/ De alguém que fica chorando de dor”. E, às pressas, no varandão do Hotel, gente chegando, gente saindo, começavam as trocas de endereços, telefones, receitas de bolo, juras de amor e tudo mais que se possa imaginar.
A família Prudente, constituída de pai, mãe e dois filhos - um menino e uma menina -, estava conhecendo pela primeira vez São Lourenço. Nos anos anteriores já havia estado em Cambuquira e Caxambu, em excelentes hotéis. Agora, os quatro gozavam as delícias de São Lourenço.
Dado todo esse panorama ao leitor, de uma época que não existe mais, com o descanso hoje se resumindo a um simples fim de semana, em viagens apressadas, torna-se necessário que o narrador focalize novamente o jantar exuberante do Hotel, de onde começou este conto/crônica, em razão do incidente inusitado ocorrido.
A noite estava fria e os garçons se esmeravam em servir uma sopa suculenta de verduras. Era a entrada de um jantar que prometia... Comida mineira à vista! Os panelões literalmente fumegavam e os hóspedes saboreavam a maravilhosa sopa, quentíssima. O ar de satisfação era geral.
De repente, para espanto de todos, ecoa um grito enorme: “Aiiiiiii”. Uma elegante senhora desmaia, apavorada! Levam-na da sala, carregada! Sussurro geral: o que houve, o que não houve, e espalha-se logo a notícia, de boca em boca. A senhora do grito lancinante havia encontrado uma barata inteirinha na sopa!
Ó tempos, ó costumes: desmaiava-se pela simples visão de uma barata! Como era bom esse tempo! Todos, sem exceção, na sala de jantar, imediatamente, pararam de tomar a sopa e ninguém comeu mais nada. A fome desapareceu. Foi um tremendo vexame. A família Prudente se retira do salão e resolve deixar o Hotel no dia seguinte. Não tinha mais férias, voltariam para o Rio e nem esperariam o pessoal cantar “está chegando a hora”. A hora já havia chegado.
O filho, desesperado, antevendo o fim melancólico de suas sonhadas férias, sacudindo os braços, põe toda a culpa no senhor Prudente:
– Pôxa, pai, o senhor, heim?
– O quê, meu filho?
– O senhor foi logo escolher um Hotel que é uma Bomba!!