A HORA DE MACABÉA

Por que não deveria estar a caminho, voltando, é que tinha esta sensação? Deveria estar rumo a outro lugar, mas, de súbito, quando eu ia, resolvi não ir. Voltar. Muito estranho. Estranho por que fugi agora a minha própria regra. O cotidiano. Não, não é culpa do meu cotidiano. Seria mais simples culpar o cotidiano por isso que estou sentido. E esse tal de “isso” é ruim para que eu tenha que me desculpar? Muito estranho. Estranho que eu pense dessa forma. Não pareço eu! Não, não pareço. Como é mesmo o nome disso? Coitada da moça! Andando desse jeito, contente, depois vem o carro, um Gringo, o gringo prometido, e atropelar. Era mesmo esta a hora? Coitada! Como é o nome disso? O nome dela era Macabéa. É, eu não poderia me chamar Macabeu. Não tem alguma coisa BA bíblia com este nome? Que burro! Se eu tivesse feito catecismo não estaria em dúvida. Teria mais fé? Será que seria mais feliz se tivesse fé? Será que eu não sou feliz e por isso não tenho fé? Ou então: por que essa sensação que me faz voltar quando deveria ir é uma fé que estou adquirindo e em razão disso vejo que não sou feliz? Vou ser? Vou ser feliz depois que passar a ter fé? É uma troca, então? Antigo testamento isso? Que merda! Essa maldita mulher tinha que jogar o pacote de salgadinho pela janela? Será que ela não vê que os relâmpagos já começaram e, daqui a pouco, tudo vai inundar? Dilúvio? Ela não vê? Como é o nome disso/ que sensação é essa? E por que ela me olha desse jeito, virando para me ver, parecendo saber o que eu penso? ”Você viu a moça sendo atropelada?”, ela diz. Tenho de olhar pela janela. Tomara que não tenha muito sangue. Que merda! O Gringo atropelou a moça! Que bom que não aconteceu antes, senão não ia mais valer a pena ler o livro. Se eu jogar o livro o Gringo vai saber ler? Vai saber de sua história já escrita? Que eu previ por que voltei, por que a mulher da frente leu meus pensamentos e eu vi? Qual o nome disso? Por que volto? Esse é o preço da fé? A Macabéa foi sacrifício? Ler é pecado! Ver é pecado! Pequei. ”Ela disse seu nome!”, me disse a mulher novamente. Ela sabia meu nome. Era a sensação, então. Era para saber meu nome? Para aquela mulher ler minhas dúvidas e premonições? Ela previa? Qual o nome disso? Esqueci de tudo, inclusive meu nome que a mulher se recusou a dizer..

Fabiano Rodrigues
Enviado por Fabiano Rodrigues em 24/02/2010
Reeditado em 25/02/2010
Código do texto: T2105561
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