ENTRE OS DENTES

No entanto, ou por coincidência, não soube precisar, a porta se abriu. Poderia? Poderia ser algo sobrenatural, poderia. Inclusive, cogitou ter visto, assim meio de repente, como quem, olhando rápido, realmente procure algo para ver. Mas, surpreendendo-se, não como era antes, sentiu um medo corroendo o estômago e cogitou que também pudesse estar sentindo fome.

Comeu a resposta para a fome.

Disseram que deveria comer. Todos os outros comemoram. Sim, eles comeram também. Não conseguiu deixar de pensar que fosse resto ou houvesse um resto na resposta da fome.

Durante alguns anos tiveram fome e agora comiam. Todos adolesciam. E para suprir logo o adolescer, comeram.

Comeu também. Comeu.

— Você comeu?

Respondeu que comeu, mas não pensou durante o trajeto de volta, enquanto os amigos descreviam o desempenho, que a havia comido.

Comera. E agora queria escovar os dentes. Era grande a possibilidade de que entre os dentes restasse ainda um resto de refeição, por isso não sorria.

Sentiu um vazio no estômago. Uma porta se abriu. Cogitou novamente a fome.

Tornou-se hábito.

Uma porta se abrindo — deixava destrancada —, a prostituta entrando, ele comendo, carnívoro, depois a necessidade contínua de encontrar os restos entre um sorriso velado e se desfazer dos ossos.

Fabiano Rodrigues
Enviado por Fabiano Rodrigues em 14/01/2010
Código do texto: T2029484
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