UM HOMEM SEM SAPATO
Olhou bem para os quadradinhos enumerados no centro da praça; tirou os sapatos, e esquecendo-se da idade. E quem de nós não esquece tantas vezes da idade?
Pulou uma, duas, três, quatro casinhas, pelas diagonais, direto? Nem sabia mais, logo chegou ao céu, mas quando voltou o rosto cândido para o começo da linha não viu seus sapatos. Levou à mão a cabeça, coçando, pensando quem roubaria seus sapatos, ali numa praça no centro de uma cidade do interior? Estava ali em visita. Mas... Descalço, as meias nos pés andando pelo chão sujo de folhas da praça.
Lembrou-se que chegara ali de manhã. E que horas seriam? Estava sem relógio no pulso. Não tinha noção de horas, ou seja, não tinha noção de como chegara ali naquela cidade pequena, que acordava tarde, pois olhe o transito movimentando-se, uma loja abrindo, com barulho violento, suas cortinas de ferro.
Sentiu-se, de súbito, tonto, vacilante das pernas: um homem sem sapato. Procurou um destes bancos tristes, errou o caminho, seguiu pela calçada, apoiando-se na cerca de aço da praça.
E a amarelinha desenhada a giz, quem deixara a amarelinha desenhada a giz lá no centro da praça? Só se recordava tirando o sapato, pulando a amarelinha, e depois cadê o sapato?
Agora era um homem sem sapato andando por uma cidade desconhecida.
Encontrou uma loja fechada numa esquina cuja marquise fazia sombra, ali se sentou, esperando que o rubor de suas faces voltasse ao menos. Era um homem vazio, não tinha duvida. Não vi sombra de gente que passasse ali, e quando fechou os olhos por um momento e os abriu novamente já viu noite fechada, mas puxa, e nem sentia falta dos sapatos, pondo-se mais cômodo de quatro, balançando o rabo, farejando o caminho, com certeza que dessa maneira chegaria a casa, mais rápido.