MACHEZA SOB SUSPEITA

O pai estava cabreiro sobre a masculinidade de seu filho. Resolveu investigar. Convidou-o então para uma cavalgada de alguns dias pra levar uns bois até uma cidade vizinha. O filho aceitou sem comentários, enquanto o velho o examinava de cima a baixo, voltando pra cima, olhando fundo no olho. O menino parecia tranquilo. Na madrugada, quando foi chamar o filho, ouviu uma voz estranha com jeito de quem estava choramingando e se lamentando. Colou o ouvido à porta e nada mais ouviu. O menino apresentou-se vestido pra viagem, bombachas, camisa larga, lenço, botas novinhas. O velho coçou a barba:

- Hummm... tais pronto então, meu filho?

- Sim, estou sim, já há algum tempo.

- Pareceu que tinha alguém resmungando e chorando aí no teu quarto quando cheguei...

- Deve ter sido um cusquinho, é um guaipeca que eu tratei de botar pra correr, pois ficava ganindo como um choro de velha, aquele desgraçado.

O velho que estava em suspenso, deu um longo suspiro diante daquela possibilidade e foi andando em direção à porta, seguido pelo filho.

Estavam já andando algum tempo, quando o rapaz pediu pra parar um pouco que queria beber água em um riacho próximo. Pararam e quando Manuel, este era seu nome, pôs as mãos em concha, um pássaro passou bem na hora largando o seu cocô na cabeça dele. Este então deu um salto e um grito meio fino, dizendo:

- Ui, que nojo... que droga... e pulando um tanto afetado tentava limpar a cabeça com uma folha colhida com raiva e pressa.

O velho franziu a testa e gritou:

- Te limpa logo, que me atrasas!

A viagem continuou por mais umas duas horas sem incidentes até que o pai propôs:

- Vamo sentá agora naquele capãozinho e descansar um pouco à sombra. E vamos comer que to ficando com muita fome.

- Pai, aquele lugar ali ?? É horrível... deve ta cheio de cobras debaixo daquelas pedras grandes. Eu li que existem...

- Te cala guri !!! Nem mais uma palavra, ouviste?!

A voz ecoou naqueles ermos como trovão e Manuel estacou mudo e muito pálido, dizendo qualquer coisa meio baixo.

Sentaram então e, enquanto comiam em silêncio, o rapaz lançava olhares assustados a cada ruído no capim, encolhendo as pernas como quem quer evitar ser mordido.

- Mas que tens hoje vivente? grita o pai num rompante. Queres enfiar estes pés debaixo da bunda?

- Nada disso, pai, é que vi umas formigas e...

- Calado!!! E homem lá tem medo de formigas?! Que tipo de macho estás a me sair?

Ao ouvir a palavra "macho" Manuel torceu a boca como se um arrepio de asco o estivesse acometendo. Mas disfarçou erguendo-se e dando largas passadas em direção à mata, pisando forte. O velho o seguia com os olhos semicerrados de dúvidas, erguendo um pouco o lado direito da cabeça. Manuel sumira de sua vista e não levou cinco segundos pra que um grito agudo cortasse o silêncio do lugar. Imediatamente o ruído de pés pisando forte na corrida e eis Manuel esbaforido tremendo todo de pavor.

- Tem um bicho lá, pai! Ouvi o barulho das patas pisando nas folhas secas, acho que tava armando o bote, a danda.

- Armando o bote??? gritou o velho. Armando o bote? repetiu arreganhando os dentes. Tais doido é? Aqui não tem disso, seu merda! Que belo cagão me saíste, hein?!!

Manuel estarrecido, não sabia o que fazer e, na confusão, sua camisa se abriu e ele não percebeu que uma tatuagem no peito, um coração atravessado por uma flecha, tinha ficado bem visível. Seu Abílio se afastara um pouco pra ver o que afinal havia de errado lá no matinho, mas mais para enganar a si próprio dando um crédito para o filho. Só que voltou quase no mesmo pé, batendo a mão na testa como que diz: "mas que despropósito é esse, não tem nada pra ver nesta porcaria de capinzal!"

Assim seguiram viagem e lá pelas tantas o guri falou que estava apertado e tinha que parar um pouco. Apeou e ficou de frente de modo que Seu Abílio visualizou a tatuagem no seu peito liso. Ficou mudo de raiva e, quando Manuel já se afastava, gritou encolerizado:

-Olha lá hein??? Vê bem o que vais aprontar!!

Se mijares agachado, seu frouxo...

EU TE MATO ! ! !

tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 26/10/2009
Código do texto: T1888694
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