Um dia diferente
Sempre que ela falava, ele nada respondia, só ouvia.
Deixava-a falar e falar. E como ela falava.
Ela fazia para humilhar, espezinhar e demonstrar de quem era o senhorio naquela casa.
Até os vizinhos, já não agüentavam mais tamanha insensatez.
Não se sabia se era por medo ou por desprezo que ele quieto ficava.
E assim foram anos e anos de uma convivência monótona.
Em um determinado dia, bem cedo, ele se levantou primeiro.
Fez o que nunca tinha feito em vinte e três anos de casamento: fez café, esquentou pães com queijo, até derreter, arrumou a mesa e a colocou, não esqueceu de colher uma flor de uma planta do vizinho que passava por sobre o seu muro, colocando-a em um jarro no meio da mesa onde estava posto o café.
O dia estava nublado, parecia que ia chover muito.
Ela, talvez pela falta de claridade na janela, demorou a acordar.
Justo naquele dia em que parecia ser muito especial.
Ele foi até a porta do quarto do casal, em passos que não se ouviam, tão leves e calmos.
Dali ficou a observá-la, estava um pouco obesa e parecia que ia longe naquele sono gostoso.
Ela se mexeu, mas somente para se ajeitar melhor.
Então, estranhamente tranqüilo, ele voltou à cozinha, abriu a gaveta do armário e pegou a faca mais afiada, a de churrasco, e voltou em direção à cama.
De súbito, subiu em cima da esposa, ela assustada quis gritar, foi quando ele aproveitou e abriu mais a boca dela, e com a faca cortou-lhe a língua.
Depois, calmamente, sujo de sangue, voltou à mesa de café, sentou e comeu, muito.