Melhor de cinco

A horda de guerreiros daklugs avançava inexoravelmente, enquanto o perverso Wurdem tentava encontrar alguma forma de escalar o penhasco contra o qual estava encurralado. Os primeiros daklugs estavam agora a não mais de 100 metros de seu odiado inimigo, e este já podia sentir suas auras inflamadas pela excitação da caçada e da vitória iminente. Mas ele não cairia sem lutar!

Virando-se de costas para a parede de pedra e encarando seus perseguidores com uma fúria fria enquanto eles ainda corriam em sua direção, o Wurdem se concentrou, reunindo as energias psíquicas que tinha dentro de si, e disparou uma barragem hipnoclástica. Os vinte ou trinta daklugs mais próximos cambalearam e caíram, agitando espasmodicamente seus tentáculos enquanto suas consciências eram fragmentadas pela enorme força do ataque mental disparado pelo terrível devorador de espíritos. Mas desta vez o Wurdem não conseguiria vencer a batalha tão facilmente, pois os daklugs haviam recebido ajuda de várias outras raças do universo na forma de instruções e reforços mentais, e centenas de outros guerreiros ultrapassaram seus companheiros caídos e continuaram avançando.

A fera acuada soltou um rugido de frustração, amaldiçoando os aliados dos seus inimigos que os haviam protegido de suas capacidades psíquicas. Quando soubera da destruição dos lufrans e da queda de Jalamon, e tomara consciência de que agora ele era o último Mal existente em todo o universo, o Wurdem não se importara muito, pois confiava em seus enormes poderes e acreditava que a derrota dos outros não o afetaria tanto. Mas ele não contara com o efeito do apoio da aliança dos povos do Bem sobre a capacidade de defesa de suas vítimas daklugs, o que era de se esperar já que os seres do Mal não dão muita importância para estas questões de cooperação e apoio mútuo. Não ocorrera a ele que, livres da opressão de outras forças malignas, os povos do Bem poderiam voltar seus esforços para ajudar os demais que ainda não tivessem se livrado do Mal, e agora ele finalmente percebia o quão terrível era estar sozinho em todo o universo. Ninguém viria em sua ajuda, nenhuma mente se abalaria por saber de sua destruição, e ele finalmente percebia como o conhecimento deste fato drenava sua energia mental e o tornava fraco perante seus inimigos.

Tentando encontrar uma forma mais eficaz de enfrentar seus atacantes o Wurdem concentrou-se sobre o que estava mais próximo e disparou um feixe psicodisruptivo concentrado. A criatura atingida estremeceu por cinco ou seis segundos e caiu sobre as grandes rochas que compunham o solo, hirta, com todos os seus músculos retesados em agonia enquanto seu espírito era esfacelado e desaparecia no nada. Mais dois ou três daklugs tiveram o mesmo destino. Mas embora a proteção psíquica estendida sobre eles pelos aliados do Bem não conseguisse protegê-los completamente deste tipo de ataque, ela fazia com que a fera da escuridão perdesse segundos preciosos para atingir a mente de cada uma das vítimas. E isso deu o tempo que os demais precisavam para se aproximarem o suficiente e finalmente começarem a revidar à violência espiritual do monstro maligno.

A visão do Wurdem enevoou-se por um momento, sob o ataque telecinético dos primeiros guerreiros do inimigo que já chegavam à distância na qual seus fracos poderes poderiam afetá-lo. Mas rapidamente ele ergueu um bloqueio contra as mentes daquelas criaturas que considerava inferiores e aguardou que chegassem mais perto antes de tentar sua última cartada. Em condições normais ele poderia enfrentar e destroçar quarenta ou cinquenta daklugs quase sem se esforçar e ainda se sentiria seguro se o número de inimigos chegasse a cento e cinquenta ou duzentos. Com muito esforço ele talvez pudesse derrotar até mesmo trezentas ou quatrocentas daquelas criaturas peludas e cheias de tentáculos, mas agora mais de quinhentas delas corriam em sua direção e contavam ainda com o apoio de seus aliados, que a fera não conseguia identificar mas percebia estarem lá. Sua situação, portanto, era desesperadora.

Porém, o flagelo da noite ainda tinha um plano. Ele avaliou que caso conseguisse se concentrar poderia abater pelo menos um terço dos atacantes com um último ataque hipnoclástico antes que as forças telecinéticas reunidas do inimigo pudessem romper sua barreira mental. Depois ele poderia utilizar suas próprias garras e dentes e seu tamanho avantajado para atacar fisicamente os inimigos restantes, e abrir uma brecha por onde pudesse escapar. Mas para isso eles teriam que chegar bem mais perto, pois sua barragem só obteria o máximo efeito quando os guerreiros inimigos estivessem a menos de dez metros dele.

E pelos instantes seguintes os daklugs continuaram se aproximando em alta velocidade da grande fera, exatamente como ela estava esperando. Mas então algo aconteceu. Ao invés de continuar correndo para ele os inimigos começaram a se amontoar a uma distância de cerca de 50 metros, formando um grande semicírculo em volta do Wurdem e deixando-o cercado contra a altíssima parede de pedra. Desesperado ele olhou ao redor, sabendo o que estava acontecendo e tentando ver de onde vinha a sua perdição. Alguém estava lendo sua mente e avisara os daklugs o que ele estava planejando! Era mais uma ação dos aliados de seus inimigos visando garantir a sua destruição!

O poderoso monstro soltou outro urro horrendo de ódio e frustração, mas os daklugs não se abalaram com o som que em outras eras seria o suficiente para enregelar os seus espíritos. Continuaram a se agrupar no grande semicírculo, e o Wurdem percebeu que estava perdido. Já sentia a força telecinética dos inimigos pressionando seu bloqueio mental, e sabia que não poderia aguentar por muito mais tempo. Em desespero ele disparou seu último e mais potente ataque hipnoclástico, mas naquela distância os guerreiros inimigos apenas cambalearam um pouco e logo voltaram a se aprumar. A proteção estendida sobre eles por seus malditos aliados das forças do Bem estava também cada vez mais forte!

E então sua barreira mental desmoronou. O esforço de sua última tentativa de ataque drenara as energias espirituais que ainda lhe restavam, e o Wurdem não conseguiu mais suportar os impulsos paranormais de seus inimigos. As forças telecinéticas concentradas de mais de meio milhar de daklugs apanharam seu corpo agora desprotegido e o arremessaram contra o penhasco, com uma força tamanha que despedaçou seus órgãos internos e quebrou a maioria de seus ossos. O cérebro da grande fera começou a ser esmagado, sua mente entrou em colapso, e um segundo mais tarde o último ser maligno da criação havia deixado de existir. O universo inteiro agora era um lugar de paz e harmonia totais, pois o Mal finalmente, após eons de lutas, dores e lágrimas, havia sido completamente derrotado!

Então os guerreiros daklugs olharam uns para os outros com os tentáculos trifurcados caídos molemente ao redor de seus corpos cilíndricos, cansados da perseguição e confusos. Eles sabiam que deveriam estar exultantes com a vitória final do Bem sobre o Mal em todo o universo, mas sentiam apenas uma difusa sensação de dever cumprido. Deviam estar contentes, imaginando seu maravilhoso futuro livres do terror e da opressão do Wurdem, mas simplesmente não tinham mais imaginação para exercitar. Alguns ainda olharam para o alto a tempo de ver as estrelas se apagando, e nenhum deles teve consciência de que seus corpos estavam desaparecendo juntamente com todas as demais entidades do universo, que naquele momento estava deixando de existir!

* * *

-Muito bom, esta foi mais uma vitória minha. Três a dois agora, certo?

-Tudo bem, tudo bem, você virou. Mas não se esqueça de que é uma melhor de cinco. Quer começar outra agora ou prefere fazer um intervalo.

-Não, vamos iniciar outra já, quero aproveitar a animação. Você quer começar?

-Não, não, você faz isso bem, comece você.

-Então está certo, lá vai: HAJA LUZ...

Leandro G Card
Enviado por Leandro G Card em 26/07/2009
Reeditado em 03/03/2023
Código do texto: T1720045
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