O Bocejo Eterno

Pouca gente sabe, mas Freud era um incansável pesquisador dos fenômenos psicossomáticos. O pai da Psicanálise passava dias estudando os efeitos da psique no corpo humano, algo que, muitas vezes, rendia episódios interessantes.

Um desses episódios praticamente desconhecidos do grande público – e até de muitos pesquisadores da vida do austríaco – é o experimento, criado e organizado por ele, conhecido como “o bocejo eterno”. Numa tarde ensolarada, Freud estava em uma confeitaria, devorando pequenos apfelstrudels, quando viu uma criança bocejar. De repente, ele próprio bocejou, sem estar com o mínimo sono. Não deu bola de início, e continuou concentrado em seus doces.

No caminho para casa, uma bela dama da sociedade cruzou seu caminho e bocejou. Como que por instinto, Freud também o fez, colocando a mão na boca, claro, para a dama não tomá-lo por mal-educado. Enquanto caminhava, pensou que aquela pequena demonstração de sono podia ser, na verdade, uma grande descoberta no campo da Psicossomática.

Como não existiam, na época, livros sobre o assunto – afinal de contas, quem escrevesse um livro sobre o bocejo provavelmente dormiria antes de terminá-lo -, Freud partiu direto para a parte prática de seu experimento. Convidou dois amigos para um chá em sua casa, e preparou o bloco de papel. Quando os dois chegaram, por volta de meia-noite, o Doutor já havia se preparado para ficar acordado (desnecessário dizer que o pai da Psicanálise era viciado em uma substância altamente estimulante).

Depois de beberem o chá, o experimento começou. O primeiro visitante bocejou primeiro. Freud anotou em seu bloco: “Adrian bocejou. 00h04min”. Quase no mesmo instante, o outro também o fez. Mais uma anotação: “Schwartz também bocejou. 00h05min”. Por fim, o próprio Doutor demonstrou estar com sono. Última anotação: “Eu mesmo bocejei. Sem sono. 00h05min”.

Assim, numa simples madrugada, Sigmund Freud descobriu que o bocejo, logo o bocejo, é contagioso. Mas, como apenas um experimento não serve de nada, persistiu no assunto, a fim de garantir que o fato era verdadeiro e não coincidência.

Quatro dias (e muitos bocejos involuntários) depois, Freud resolveu ser ousado: convidou 43 pessoas – número esse friamente calculado, para que o experimento tivesse êxito absoluto – para participarem de um grande teste. Como um número grande de pessoas assim precisa de um estímulo para participar de coisas desconhecidas, o Doutor teve que abrir o bolso e oferecer uma pequena gratificação para cada um.

Quando todos se reuniram, Freud acendeu uma fogueira – vale lembrar que “O Bocejo Eterno” foi feito em um sítio nos arredores de Viena, e no inverno, daí a necessidade da fogueira – e começou a fazer perguntas aos presentes, dando início a uma agradável conversa. Bloquinho na mão, estava preparado para fazer suas anotações. Se tudo desse certo, ia entrar para a história não como o pai da Psicanálise (termo esse muito chato, por sinal), mas sim como “o pai do bocejo infinito”, muito mais respeitável.

De repente, deu-se início ao maior fenômeno de todos os tempos. Uma menina deu o primeiro passo – quer dizer, o primeiro bocejo. Como que em efeito dominó (dizem os etimólogos que a expressão surgiu nesse dia), todos começaram a bocejar, um por um, mesmo sem estarem com sono. Quando todos já haviam sofrido o “contágio” do sono, aconteceu algo surpreendente: a primeira menina bocejou novamente, fazendo com que o efeito fosse repetido sobre os outros...

O experimento deu tão certo que todos saíram de lá extremamente empolgados. Todos, menos Freud. A conclusão do teste foi que, por quatro dias e quatro noites, todos ficaram bocejando incessantemente. Tentavam, mas não conseguiam parar. O evento só acabou porque, um a um, todos desmaiaram de sono. Inclusive Sigmund.

Depois de voltar para casa e analisar suas anotações, o Doutor viu que o bocejo é realmente um fenômeno incrível - o sono de uma pessoa passa para a outra, como catapora. Mas, ao mesmo tempo, descobriu que é algo extremamente perigoso. Traumatizado com a experiência de não conseguir fechar a boca, Freud, desde aquela noite, tornou-se cada vez mais dependente da cocaína. Não queria, nunca mais, bocejar.