POR BAIXO DO PANO

Era uma vez um palhaço. Um palhaço colorido, com cara de palhaço. E fazia lá suas palhaçadas nos picadeiros de todos os dias, no grande circo da realidade.

O número mais constante nas suas apresentações era aquele em que uma bota preta rota dava-lhe um pontapé no traseiro: pronto! lá estava ele mais uma vez no chão vendo estrelinhas...

Creio que ele gostasse daquele mundo tão estrelado. Mil luzes. Cores. Viver de pontapé em pontapé. Ser simples peça dum jogo aleatório, regrado pelas arbitrariedades dos donos da existência... Quem pode dizer que não?

Um dia o tal palhaço deitou-se sobre uma imensa folha de papel branco e rolou. Rolou naquele espaço branco, virgem, sem nenhum dizer. Rolou durante dias, semanas. Era um número completamente original, nunca antes tentado por outro palhaço da vida.

Foi assim rolando e enrolando toda a graça que concedia de graça a tantos tão à toa.

Era agora um cilindro deslizando desconcertado enquanto rabiscava gigantesca propaganda de produto de consumo. O papel ia se tingindo de vários matizes entre os quais o vermelho sobressaía.

- Que campanha publicitária mais doida!

- Que anúncio é esse?

Aos poucos se afiletava sem que percebessem. Todos estavam atentos ao excêntrico e inusitado informe publicitário.

Que estaria se dizendo a si mesmo naquelas voltas tresloucadas em torno de seu próprio corpo-eixo? Alguma queixa?

Não. Devia estar completamente bozo, digo, zonzo.

O palhaço se ia desgastando. No papel branco, um enorme desenho. Era um produto para o consumo feito com o sumo dum palhaço enrolado.

De repente. Não mais que de repente. Saltam aos olhos da platéia atônita - como não poderia deixar de ser - três lindas moças sorridentes, e o mistério todo se desvenda:

- Senhoras e senhores, apresentamos-lhes o mais recente lançamento da nossa indústria: GRACIOSO, um novo papel higiênico, que fará seu bumbum sorrir!