Remota Samarcanda, bela e altiva
Através do mercado de Bagdade, na Pérsia antiga, no meio do bulício do gentio, entre ofertas abundantes, tecidos, frutas, alfombras, comidas, bebidas, esplêndidas e variadas mercadorias vindas dos quatro pontos cardeais, vão dois soldados depois de terem servido com arrojo na última guerra ao seu Senhor.
No meio de todo isso vão, a caminhar e a rir, quando de pronto um se detém, suspeitando que alguém espreita, e, virando-se, vê os olhos da Morte a escrutá-lo com gesto ameaçante.
Muito assustado então, foge onde o seu Califa para lhe pedir ajuda, dando-lhe este um dos seus mais velozes cavalos, para que escape durante a noite, longe, muito longe, a Samarcanda (a hospitaleira, a que com Ispahão, Damasco, Bujara Merv, e O Cairo, fazem oásis que um imprevisto vendaval de areia, num instante tão só, poderia devolver ao deserto), Samarcanda, o mais belo rosto que a terra jamais virasse ao sol, a rainha do mundo, a mais altiva de todas as cidades, cujo fado tem entre suas mãos, à que os astrólogos desde o alvor dos tempos proclamaram, sem mentirem, uma das quatro nascidas baixo o signo da rebelião com A Meca, Damasco, Palermo, mais ela, a mítica, a remota, Samarcanda.
Essa noite, em Palácio, comemora-se a vitória. Todo o mundo baila celebrando o grande triunfo do poderoso soberano. Ao fundo da imensa sala, entre os numerosos comensais, aparece de repente a Morte. Rapidamente o Califa, indignado, abrindo-se passo entre a multidão, com voz reprovadora diz-lhe que como se atreve a assustar a um dos seus melhores soldados, a quem tantos perigos tinha enfrentado e sorteado no seu nome, baixo sua bandeira.
Não pretendia assustá-lo, replica desconcertada a Morte, só que me surpreendi de vê-lo ali, no mercado, em Bagdade, quando amanhã tínhamos uma cita em Samarcanda.