Medo

Toda vez que eu passo por aqui, eles parecem estar me vigiando. Me cobiçando com os olhos — e a maioria nem olhos têm. Talvez queiram minha alma. Seriam eles sugadores de ectoplasma? Talvez queiram minha carne. Não, eles não são zumbis. Estão mortos, mas a aparência é impecável. Não tem nada caído — a não ser membros decepados.

Por que são assim? Por que estão aí? E por que alguém faria isso com eles? Bom, eu não sei.

A princípio pensei que eram apenas esses aqui na esquina de casa, mas percebi que a chacina está espalhada pela cidade. São corpos sem cabeça, sem braços, pernas e até cortados ao meio, mas aqui estão os mais assustadores. Tenho medo só de passar perto. Crianças e bebês decapitados, despedaçados, mutilados e todos em exposição.

Por que alguém colocaria em exposição cadáveres — ou partes deles. E o que mais me intriga é que sempre estão trocando de roupas e assessórios. Parece irônico, mãos de mortos cobertas de ouro. E tudo ali atrás do vidro para todos verem.

Fiquei sabendo que eles tem nome a pouco tempo. Eu sempre receava perguntar aos outros sobre eles, me parecia proibido ou coisa assim. Desconfiava que eles fossem alvos dos nazistas, mas não podem ser, são em geral de raça ariana. Talvez seja a vingança dos mestiços e judeus que está vindo à tona. Ah! O nome deles, quase me esqueço. Perguntei pra minha mãe semana passada quando me levava para a escola. Não mencionei nada sobre campos de concentração ou aqueles vídeos de chacina que vi na internet. A única coisa que eu disse foi:

— Mamãe quem são eles? — e apontei como o dedo.

E ela respondeu:

— Manequins. Eles são manequins.

Samuel Farias
Enviado por Samuel Farias em 02/11/2008
Reeditado em 02/11/2008
Código do texto: T1261915
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